O Bacillus thurigiensis ou Bt como é mais conhecido, é uma bactéria naturalmente encontrada no solo. Esse microrganismo chama a atenção dos pesquisadores há décadas, por ser muito eficiente em matar espécies específicas de insetos. Desde então tecnologias Bt têm sido desenvolvidas para combater as pragas no campo e auxiliar o agricultor com a produção e segurança dos alimentos.
Bacillus thurigiensis 120 anos de sua descoberta
O Bacillus thurigiensis foi descoberto em 1901 pelo biólogo japonês Shigetane Ishiwatari. O pesquisador identificou a bactéria como sendo o agente responsável pela morte de milhares de larvas do bicho da seda. Naquela época a “doença do colapso súbito” causava grandes prejuízos na produção de fibras de seda do país.
A versatilidade das fibras naturais
A mesma bactéria foi encontrada na região de Turíngia (Alemanha), em 1911, pelo pesquisador Ernst Berliner. O microrganismo estava matando traças da farinha, um tipo de mariposa bastante comum e que ataca diversos produtos armazenados como milho, trigo, arroz entre outros.
Foi Berliner quem nomeou a bactéria como Bacillus thurigiensis, uma homenagem a região em que foi encontrada. Também foi Berliner quem fez a descrição de estruturas semelhantes a cristais no interior dessas bactérias, que futuramente viriam a ser identificadas como responsáveis pela ação inseticida das bactérias Bt.
Atualmente, sabe-se que esses cristais são um tipo de toxina biodegradável, inofensiva ao ser humano, aos vertebrados e às plantas, mas altamente específica a insetos-alvo. Mesmo antes de se compreender o mecanismo de ação da bactéria Bt, na década de 1920, agricultores já utilizavam esse microrganismo como defensivo biológico e em 1938 já apareciam no mercado defensivos formulados utilizando o Bt como princípio ativo.
Evolução da agricultura brasileira e inovação no desenvolvimento de defensivos
Conheça os protagonistas dos produtos biológicos disponíveis no Brasil
A eficiência dos produtos a base de Bt tiveram uma alta na década de 1960. A descoberta da atividade inseticida da proteína que forma os cristais Bt (proteínas Cry) pelos pesquisadores Hannay e Fitz-James direcionou o estudo bioquímico e genético das proteínas Cry. A partir daí diferentes isolados de B. thurigiensis foram sendo descobertos, cada um capaz de produzir diferentes tipos de cristais com ação específica para um grupo de insetos.
Atualmente, milhares de bactérias Bt foram encontradas em todas as partes do mundo. Muitas delas possuem genes que codificam cristais únicos e que podem ser utilizados no controle de diferentes pragas. Inclusive, não apenas contra insetos, mas também para combater nematoides, ácaros e protozoários.
Além disso, a biotecnologia moderna reuniu ferramentas para que os pesquisadores pudessem transferir o gene dessas bactérias para plantas, que passaram a produzir esses cristais e combater larvas de alguns insetos. Diminuindo assim a necessidade do emprego de alguns defensivos.
As tecnologias Bt
Atualmente o Bacillus thurigiensis é uma importante fonte de tecnologia agrícola, sendo a base para formulação de produtos capazes de promover uma agricultura mais verde. A identificação de diferentes isolados Bt, que produzem diferentes cristais, é fundamental para o desenvolvimento de novos produtos biológicos.
Grande parte dos produtos biológicos disponíveis no Brasil são de origem microbiológica e muitos deles são formulados a partir de diferentes isolados de Bt. Esses bioinseticidas são utilizados para eliminar diversas pragas das culturas de algodão, soja e milho, mas também podem ser empregados em plantações de abobrinha, berinjela, tomate, uva, morango, abacaxi e muitas outras. Esses produtos podem ser usados, inclusive na agricultura orgânica.
Modos de produção com diversidade: o Brasil tem espaço para todos
Em 2013, os biodefensivos Bt foram a única solução encontrada para combater lagartas da espécie Helicoverpa armigera. Praga que vinha devastando as lavouras de soja, milho, algodão e feijão de norte a sul do País.
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Agentes biológicos, interações da natureza levadas para a agricultura moderna
Mas nem só de defensivos vive a agricultura
Com o advento da genética e biologia molecular, os pesquisadores passaram a estudar e caracterizar os genes responsáveis por produzir esses cristais de proteínas com ação tóxica e assim entender como cada uma funciona.
Com isso, iniciaram a classificação dessas proteínas em diferentes grupos e cada nova toxina identificada recebeu um nome. Alguns exemplos são: Cry, Cry1Aa, Cry1Ab, Vip, Vip1Aa1, Vip1Aa2 e também as do grupo Cyt.
Desde que o primeiro gene de uma proteína Bt foi sequenciado em 1981, 993 genes que codificam toxinas Bt foram identificados, incluindo 801 genes Cry, 40 genes Cyt e 152 genes Vip. Você pode acessar uma lista com todas as proteínas identificadas clicando aqui!
A biotecnologia Bt
Na década de 1980, a biotecnologia moderna trouxe então estratégias para isolar e transferir genes de um organismo para outro, surgindo assim os Organismos Geneticamente Modificados. Com isso, os pesquisadores conseguiram transferir os genes que codificam essas proteínas para o genoma de certas plantas, desenvolvendo plantas transgênicas.
Existe um grande número de plantas transgênicas que foram desenvolvidas utilizando genes Bt, essas ficaram conhecidas como plantas Bt.
Tanto as bactérias que naturalmente possuem esse gene, como as plantas transgênicas que receberam um ou mais desses genes, produzem os cristais que servem de inseticidas contra alguns insetos. Por exemplo, a proteína produzida a partir do gene Cry1 Ab apresenta toxicidade específica para alguns insetos da Ordem Lepidoptera (borboletas e mariposas). Fazendo com que as plantas se defendam contra essa praga.
Desde então, genes identificados em Bacillus thurigiensis são profundamente estudados e muitos deles transferidos para diferentes plantas:
Benefícios das tecnologias Bt
Tanto os defensivos biológicos desenvolvidos a partir de diferentes isolados de Bacillus thurigiensis, assim como as plantas Bt possuem efeito direto na diminuição das aplicações de defensivos químicos.
Um grande benefício dos bioinseticidas que possuem o Bacillus thurigiensis como princípio ativo, é que quando aplicado no campo, o microrganismo passa a fazer parte do ecossistema. Com isso, além de controlar a praga alvo, a bactéria pode melhorar a qualidade do solo e promover o melhor desenvolvimento da planta. Vale lembrar que, assim como as plantas Bt, as bactérias Bt também são altamente específicas no controle de insetos pragas.
Ambas as tecnologias ainda trazem benefícios como:
- Favorece a segurança alimentar
- Favorece o plantio direto
- Estimula a biodiversidade
- Diminui a erosão do solo
- Melhora a produtividade e rentabilidade no campo
Diferentes tecnologias desenvolvidas a partir de um mesmo microrganismo que devem ser utilizadas a depender das necessidades do produtor dentro de um Manejo Integrado de Pragas (MIP).
Principais fontes:
Azizoglu, U. Bacillus thuringiensis as a Biofertilizer and Biostimulator: A Mini‑Review of the Little‑Known Plant Growth‑Promoting Properties of Bt. Current Microbiology, 2019.
Domínguez-Arrizabalaga, M., et al. Insecticidal Activity of Bacillus thuringiensis Proteins against Coleopteran Pests. Toxins, 2020.
Hajimohammadi, B., et al. Safety assessment of genetically modified rice expressing Cry1Ab protein in Sprague–Dawley rats. Nature, 2021.
Peng, Q., Yu, Q., e Song, F. Expression of cry genes in Bacillus thuringiensis biotechnology. Applied Microbiology and Biotechnology, 2019.