Descubra a importância dos organismos geneticamente modificados
São identificados como Organismos Geneticamente Modificados, ou simplesmente OGMs, aqueles seres vivos que tiveram seu material genético (DNA/RNA) alterado por técnicas de engenharia genética.
A princípio pode lhe parecer algo extremamente moderno e inovador, mas há milhares de anos já modificamos o genoma de plantas e animais no processo conhecido como domesticação. Inicialmente esse processo foi realizado por meio de cruzamentos de seres vivos com características desejáveis para a alimentação.
A domesticação de grãos e cereais, de plantas frutíferas e animais – como ovelhas, cabras e até mesmo cachorros – acompanharam o desenvolvimento das civilizações.
No entanto, a inovação na biotecnologia e o desenvolvimento da engenharia genética permitiram o aprimoramento de técnicas que além de acelerarem, aumentaram a precisão e a confiabilidade das alterações no material genético dos organismos vivos.
Engenharia genética e a produção de organismos geneticamente modificados
As técnicas de engenharia genética começaram a ser desenvolvidas no início da década de 1970, com a descoberta e aplicação das chamadas nucleases de restrição (enzimas que cortam o DNA). Essas enzimas permitem cortar o DNA em pontos bem definidos, conforme pode-se observar na imagem abaixo. A identificação dessas enzimas foi um marco importante para o desenvolvimento da tecnologia do DNA recombinante, considerada a técnica mais empregada na engenharia genética.
Desde então, os cientistas passaram a identificar, isolar, replicar e sequenciar fragmentos de DNA passíveis de serem introduzidos no genoma de um organismo. Com isso, é possível manipular o material genético e reintroduzi-lo em uma célula vegetal ou animal.
Os organismos decorrentes dessa alteração passaram a ser denominados organismos geneticamente modificados (OGM).
Além da introdução de genes no genoma de um organismo, com a engenharia genética, também é possível silenciar (“desligá-lo” e fazer com que o gene não tenha efeito), deletar ou editar genes.
Organismos geneticamente modificados e suas aplicações
Os primeiros organismos geneticamente modificados foram desenvolvidos na Universidade de Stanford pelos pesquisadores Stanley Cohen, Annie Chang e outros colaboradores. Bactérias foram os primeiros seres vivos a terem seu material genético alterado pela introdução de fragmentos de DNA de outros organismos.
Os primeiros OGMs apresentavam resistência a antibióticos específicos e serviram para avaliar se era possível transferir genes entre diferentes organismos, inclusive entre espécies diferentes. Fato esse que comprovou que a molécula de DNA é composta das mesmas substâncias, independente do organismo vivo.
Uma das principais aplicações da engenharia genética e desenvolvimento de OGM é na diminuição da fome no mundo. Uma vez que, ao acelerar o melhoramento genético de plantas é possível obter cultivares de milho, soja, cana-de-açúcar, trigo e muitos outros vegetais com vantagens sobre a produção agrícola.
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Essa aceleração do melhoramento possibilita maior produtividade, com facilidade de manejo da lavoura, menor gastos com insumos, incluindo o combustível utilizado em maquinários. Tudo isso sem a necessidade de grandes expansões da área agrícola. O resultado é um aumento na disponibilidade de alimentos e redução nos preços, como dados na imagem abaixo.
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Organismos geneticamente modificados na produção industrial
Os OGMs vão muito além da agricultura. As principais matérias primas de indústrias como: a de alimentos, papel e celulose, têxtil e farmacêutica, são um tipo de proteínas conhecidas como enzimas. As enzimas são grandes responsáveis por acelerar as reações químicas dos sistemas biológicos.
Essas enzimas podem ser extraídas de diversos organismos, modificadas por técnicas de engenharia genética e introduzidas em processos industriais.
De um modo geral, as enzimas podem ser extraídas de diferentes seres vivos, incluindo plantas, animais e microrganismos. No entanto, o processo de fermentação, realizado por microrganismos torna esse grupo de seres vivos primordialmente utilizados como fonte de obtenção de enzimas.
As enzimas industriais são produzidas em 50% por fungos, 35% por bactérias e apenas 15% são extraídas de animais e vegetais. Os microrganismos apresentam vantagens como:
- Facilidade de obtenção das enzimas;
- Produção mais rápida;
- As enzimas de microrganismos são mais estáveis e apresentam maior atividade;
- Facilidade de caracterização das enzimas;
- Resistência a altas temperaturas;
- Os microrganismos são mais fáceis de transporte e requerem espaços menores;
Além disso, os microrganismos são mais fáceis de serem geneticamente modificados para obter enzimas otimizadas, com rendimentos mais elevados e características específicas para cada tipo de indústria e produto.
Dessa forma, os microrganismos geneticamente modificados proporcionaram um maior aumento na produção de enzimas, no rendimento e também limitam a produção de substâncias indesejadas como por exemplo, micotoxinas.
Além disso, com a engenharia genética, foi possível fazer com que os microrganismos passassem a produzir enzimas anteriormente encontradas apenas em animais ou plantas. Com isso, reduzindo o emprego desses seres vivos, otimizando processos, diminuindo custos e barateando produtos.
Por exemplo, a enzima quimosina utilizada na produção de queijos, foi por muito tempo foi extraída do estômago de bezerros. A engenharia genética permitiu que bactérias passassem a produzir essa enzima, evitando a necessidade do sacrifício desses animais. Hoje, as enzimas produzidas por esses microrganismos geneticamente modificados são as mais utilizadas.
Além disso, na indústria de alimentos, existem outras enzimas como amilases e xilanases, que dão sabor e textura a pães e massas; proteases, que tornam a carne mais macia; lipases que auxiliam no processamento de laticínios, inclusive produtos como whey protein e muitas outras proteínas que podem auxiliar no processamento de bebidas, vegetais, óleos e gorduras.
Enzimas produzidas por microrganismos geneticamente modificados também são utilizadas na produção de sabão em pó, auxiliando na eficiência do produto; na transformação da biomassa vegetal em biocombustível; no processamento de celulose para produção de papel; no acabamento e tratamento de tecidos para a indústria têxtil.
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A versatilidade das fibras naturais
Tem organismos geneticamente modificados na área da saúde, sim
Na saúde, os OGMs são utilizados desde a década de 1980. A partir da engenharia genética foi possível introduzir em uma bactéria o fragmento de DNA (gene) responsável pela produção da insulina.
Com isso, a insulina utilizada por pacientes diabéticos passou a ser produzida por microrganismos geneticamente modificados, e não mais extraída do pâncreas de bovinos e suínos. Atualmente, vitaminas, anticorpos para vacinas, antibióticos e remédios – como o utilizado para combate a AIDS – também são produzidos com o auxílio de engenharia genética.
De fato, diferentes setores da sociedade se beneficiaram e desenvolveram estratégias viáveis e seguras para o desenvolvimento de Organismos Geneticamente Modificados (OGM) voltados ao atendimento das demandas dos consumidores e de uma produção sustentável de alimentos, fibras e energia.
Regulamentação dos organismos geneticamente modificados
A regulamentação dos organismos geneticamente modificados começou a ser discutida três anos após o desenvolvimento da tecnologia do DNA recombinante (1972). Desde então, cada país tem estabelecido suas próprias legislações sobre os OGMs.
Entenda também: Qual a diferença entre organismos transgênicos e cisgênicos
Brasil e OGMs
No Brasil, a liberação comercial de um produto geneticamente modificado (GM) só acontece após a análise das avaliações de biossegurança exigidas pela lei nº 11.105 (Lei de Biossegurança). A Lei estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização para atividades com OGM e seus derivados que vão desde o desenvolvimento até o monitoramento dos produtos no mercado.
De acordo com a Lei 11.105 compete à Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), instância colegiada vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), estabelecer normas para as pesquisas com OGM e derivados de OGM e à análise da avaliação de risco do OGM no vegetal, ambiente e na saúde animal e humana.
Atualmente, o Brasil já aprovou 182 organismos geneticamente modificados. Compondo esse grupo de produtos encontramos plantas, vacinas, medicamentos, microrganismos (como leveduras e microalgas) e insetos como o mosquito Aedes aegypti, transmissor de doenças como dengue, zika vírus e febre chikungunya.
Quer saber mais sobre o processo de aprovação de OGMs no Brasil? Acesse: Regulamentação da biotecnologia garante segurança durante o desenvolvimento e uso dos produtos biotecnológicos
Segurança dos OGMs
Passadas mais de quatro décadas do advento da engenharia genética e produção de organismos geneticamente modificados, nunca houve relato de algum malefício decorrente de um OGM ao meio ambiente ou à saúde de animais e humanos.
Em 20 anos de adoção no Brasil, os OGMs mostraram-se eficientes e seguros. Ao longo deste período, nenhum malefício foi registrado. Essa é, por exemplo, a conclusão da Comissão Europeia que, desde os anos 2000, já publicou diversos relatórios desenvolvidos pela comunidade científica do continente. Estudos de longo prazo chegaram à mesma conclusão que os trabalhos europeus, a exemplo do amplo trabalho publicado em 2014 na revista científica Journal of Animal Science. Conduzido pela geneticista Alison Van Eenennaam, da Universidade da Califórnia-Davis, a pesquisa analisou 29 anos de produção pecuária e apresentou dados sobre a saúde dos animais antes e depois da introdução dos transgênicos. A conclusão do estudo é que a alimentação transgênica é equivalente à não-transgênica.
Cabe citar, ainda, relatório da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos (2016), que confirma que os transgênicos são seguros para a alimentação humana e animal e para o meio ambiente. Além disso, cientistas e organizações ao redor do mundo, incluindo a Organização Mundial da Saúde (OMS), pronunciaram-se a favor das culturas GM e de sua segurança como alimento.
Principais fontes:
Bruetschy, C. The EU regulatory framework on genetically modified organisms (GMOs). Transgenic Research, 2019.
Santis, B. Case studies on genetically modified organisms (GMOs): Potential risk scenarios and associated health indicators. Food Chemical Toxicology, 2018.
Thygesen, P. Clarifying the regulation of genome editing in Australia: situation for genetically modified organisms. Transgenic Research, 2019.