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Desperdício de alimentos no mundo: o problema também é nosso

O volume global de desperdício de alimentos estimado pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e a Agricultura (FAO) chega a 1,6 bilhão de toneladas de produtos primários – que são matérias-primas para outros produtos e alimentos ao ano. Já o desperdício total somente de alimentos chega a 1,3 bilhão de toneladas por ano.

Esse desperdício equivale a um pouco mais de ¼ de todo alimento produzido anualmente no mundo. Lembrando que existem quase 7,5 bilhões de pessoas neste planeta e este número continua a aumentar e deve chegar a 10 bilhões em 2050. 

Ou seja, quando as previsões comparam população x produção x desperdício de alimentos, pode ser que não consigamos superar a fome da população, se não houver a redução das toneladas de comida no lixo.

Mas, como todo esse alimento é desperdiçado?

Se levarmos em consideração números de pessoas que viviam em condições de fome em 2006, é possível estimar que em 2050 precisaremos produzir 69% mais fontes de nutrientes em alimentos. Além disso, as perdas alimentares também representam um desperdício de recursos usados na produção, como terra, água, energia e insumos. 

Com isso, a produção de alimentos que não serão consumidos leva a emissões desnecessárias de CO2 – contribuindo para o aquecimento global e as mudanças climáticas – além da perda de valor econômico dos alimentos produzidos.

A percepção comum leva muitos a pensarem que toda a produção de alimentos vai do produtor à mesa dos consumidores. Entretanto, essa percepção é equivocada pois, 30-50% dos alimentos produzidos não chegam às nossas casas. 

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Mas, é importante dizer que quando nos referimos ao desperdício de alimentos, estamos falando apenas daqueles produtos que são direcionados ao consumo humano, excluindo rações e produtos que não são comestíveis.

Desperdício de alimentos pode acontecer em diferentes etapas da produção

Por definição, a perda ou o desperdício de alimento acontece quando qualquer produto – seja um grão de soja, uma fatia de pão ou até mesmo um suco de laranja – é perdido antes de ser ingerido por uma pessoa.

Examinando especialmente a parte da cadeia alimentar que está relacionada ao armazenamento e ao transporte, o prejuízo pode representar 17% da produção global de alimentos. Isso porque, quando transportados ou armazenados, os grãos ficam expostos a micróbios e insetos que encontram o ambiente ideal para crescerem.  

Em países de baixa renda, as principais causas de desperdício de alimentos estão ligadas às  limitações financeiras, gerenciais e técnicas na colheita, armazenamento e refrigeração em condições climáticas difíceis, infraestrutura, embalagens e sistemas de comercialização. Dessa forma, os alimentos são desperdiçados todos os anos durante o processo de produção. Sem mencionar, o desperdício que ocorre dentro de nossas casas.

Infográfico mostrando os níveis de desperdício de alimentos no mundo, separados pelas principais regiões, com estimativas para 2030 e 2050

Principais fontes de desperdício e perdas de alimentos

A Organização das Nações Unidas (ONU) definiu os 5 principais fatores causadores do desperdício de alimentos:

1. Produção agrícola:

Perdas devido a danos mecânicos e/ou derramamento durante a operação de colheita;

2. Manuseio e armazenamento pós-colheita:

Perdas devido a derramamento e degradação durante o manuseio, armazenamento e transporte entre a fazenda e a distribuição. De todas as frutas e vegetais que vão para o lixo no Brasil, cerca de 50% são perdidas durante o transporte e manuseio;

3. Processamento:

Perdas devido a derramamento e degradação durante o processamento industrial ou doméstico, como: produção de suco, enlatamento e panificação;

4. Distribuição:

Perdas e desperdícios no sistema de mercado, por exemplo: mercados atacadistas, supermercados, varejistas e feiras.

5. Consumo:

Inclui perdas e desperdícios durante o consumo ao nível doméstico.

Infográfico mostrando os focos de desperdício de alimentos no Brasil, enfatizando o transporte, manuseio e centrais de abastecimento como principais foco de desperdício

Reduzir as perdas e o desperdício de alimentos é essencial em um mundo onde o número de pessoas afetadas pela fome tem aumentado lentamente desde 2014, e toneladas de produtos comestíveis são perdidos e/ou desperdiçados todos os dias.

Quais são as ações para minimizar o desperdício?

Mesmo que existam dezenas de abordagens para combater esse perigo emergente, não há solução para resolvê-lo de forma imediata.

Embora entre os anos de 2005 e 2015 a fome do mundo tenha apresentado uma tendência de queda, nos últimos 5 anos a fome aumentou lenta, mas continuamente. Em 2018, aproximadamente 820 milhões de pessoas em todo o mundo estavam subnutridas – contra 785 milhões de quatro anos atrás.

Por esse motivo, a ONU anunciou em 29 de setembro de 2020 a primeira celebração do Dia Internacional da Conscientização sobre a Perda e o Desperdício de Alimentos. A data trouxe um despertar global sobre a necessidade de transformar e reequilibrar a forma como nossos alimentos são produzidos e consumidos.

Além disso, o tema é enfatizado em um dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU que também estabeleceu a meta de reduzir pela metade o desperdício de alimentos até 2030. A ideia é que a diminuição no desperdício seja um desafio de todos, envolvendo a cadeia produtiva, o transporte, o varejo e o consumidor. 

Ciência e tecnologia para resolver o problema

A ciência e a tecnologia já caminham a passos largos no desenvolvimento de algumas soluções para minimizar esse problema. Lá no campo, as principais medidas para diminuirmos as perdas de colheita se dão desde a escolha das cultivares ao plantio no período adequado, evitando atrasos que podem provocar grandes prejuízos.

O controle de pragas e doenças empregando defensivos químicos e biológicos, cultivares Bt e sistemas de irrigação também são essenciais para a redução da perda de alimentos. 

Além disso, ter um solo muito bem manejado, com boa fertilidade e técnicas de conservação do solo são igualmente importantes na minimização dos desperdícios.

Melhoramento genético e biotecnologia

Você sabia que o melhoramento genético de plantas vem desenvolvendo vegetais que conseguem ter uma maior durabilidade nas prateleiras dos supermercados e também em nossas casas?

Um exemplo são cultivares de amendoim, desenvolvidas pelo Centro de Grãos e Fibras do Instituto Agronômico (IAC), de Campinas. Essas plantas geneticamente melhoradas, além de apresentarem maior vida de prateleira, possuem maior teor de ácido oleico no grão, benéfico para a nossa saúde.

Principalmente para hortaliças, diversas pesquisas estão sendo conduzidas para aumentar esse tempo de prateleira. Desde 1995, pesquisadores norte americanos já testavam a indução de mutações em variedades de tomate com objetivo de selecionar aqueles que teriam um maior tempo para chegar ao amadurecimento, aumentando assim a vida útil do vegetal.

Além disso, a introdução de novas variedades, como a alface ‘americana’ no mercado consumidor pode ajudar a reduzir as perdas. Mesmo com outras características de textura e sabor, quando comparada às alfaces ‘crespa’ e ‘lisa’ – que são mais difundidas nos mercados – a alface ‘americana’ consegue ter uma maior durabilidade, se armazenada corretamente.

As plantas frutíferas, por exemplo, estão sujeitas a inúmeras pragas e doenças, causadas por fungos, bactérias, nematoides e vírus. Esses fatores dificultam o crescimento e o desenvolvimento das plantas e afetam diretamente a produtividade. O desenvolvimento de cultivares resistentes/tolerantes por CRISPR/Cas9 a esses estresses bióticos pode ter um grande impacto em sua produção.

Tecnologia e agricultura 4.0

A tecnologia IoT (internet das coisas) oferece soluções que melhoram a cadeia de suprimentos, pois utiliza uma ampla variedade de sensores, alguns deles com medições de altíssima precisão e algoritmos de aprendizado de máquina.

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A utilização de sensores, por exemplo, é capaz de detectar e transmitir informações sobre os produtos agrícolas durante o armazenamento, seja um grão, fruta, legume ou verdura. Um grupo de sensores pode registrar as flutuações de temperatura, umidade e trocas gasosas, que podem representar ameaças aos alimentos armazenados. 

Essas medições e o monitoramento fazem com que seja mais fácil tomar decisões certeiras no controle de possíveis pragas e doenças que atingem grãos armazenados, por exemplo. Com isso, o controle preventivo pode ser feito com maior eficácia.

Mas não para por aí. Para o transporte de alimentos – desde que saem das propriedades, até os centros de beneficiamento e distribuição – são estudadas as cadeias de frio. Que nada mais são do que toda uma logística de refrigeração, que começa logo após a colheita no campo, passando pelo transporte refrigerado em caminhões adaptados com baixa temperatura, até os alimentos chegarem aos locais de distribuição.

Principalmente para hortifrutis, a implantação do sistema de rastreabilidade do alimento vai ajudar também durante toda a logística e venda dos produtos.

Rastreabilidade dos produtos agrícolas

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Na área da ciência, tecnologia e engenharia de alimentos, algumas pesquisas têm o objetivo de desenvolverem embalagens que aumentem a vida útil do alimento (em inglês, shelf life). A utilização de embalagens à vácuo, por exemplo, impede que microrganismos se desenvolvam– por falta de oxigênio – e causem problemas no pós colheita.

Outras pesquisas têm como objetivo desenvolver resinas plásticas biodegradáveis que melhorem a segurança na ingestão de alimentos, além de prolongarem o seu tempo de vida útil. As embalagens inteligentes unem desempenho para aumentar o shelf life de alimentos com tecnologia. Basicamente, elas avisam quando o produto não estiver mais próprio para o consumo.

Uso de ceras e recobrimentos com produtos da nanotecnologia também são alternativas importantes e necessárias para que as taxas de desperdício de alimentos sejam cada vez menores.

Mas e você? Você também é importante para reduzir o desperdício!

Lembrando que o desperdício em nossas casas pode chegar em até 10% de todo alimento que vai pro lixo, pequenas mudanças em nossos hábitos diários podem ter um grande impacto global. Você pode desde comprar frutas e vegetais “feios”, até reorganizar sua geladeira.

Com milhões de pessoas sofrendo de desnutrição, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) publicou uma lista de medidas simples, mas sensatas, que todos podemos adotar para mudar nossos hábitos:

  1. Compre apenas o que você precisa. Faça uma lista e cumpra-a.
  2. Não seja preconceituoso. Compre frutas e vegetais ‘feios’ ou de formato irregular que sejam igualmente bons, mas tenham uma aparência um pouco diferente.
  3. Verifique sua geladeira. Armazene os alimentos entre 1-5 °C para máximo frescor e prazo de validade.
  4. Primeiro a entrar, primeiro a sair. Ao empilhar a geladeira e os armários, mova os produtos mais antigos para a frente e coloque os mais novos atrás.
  5. Entenda as datas. ‘Consumir até’ indica uma data em que o alimento é seguro para ser consumido, enquanto ‘melhor antes’ significa que a qualidade do alimento é melhor antes dessa data, mas ainda é seguro comer depois dessa data.
  6. Não deixe nada para trás. Guarde as sobras para outra refeição ou use-as em um prato diferente.
  7. Doe qualquer excedente a terceiros.

Na hora de cozinhar, diversifique!

Hoje, já são muitos profissionais de nutrição e cozinheiros que abraçaram a causa da redução dos desperdícios e desenvolveram ótimas alternativas para o consumo integral daquele alimento da nossa geladeira.

Inclusive, existem cozinheiros especializados no assunto que dão aulas e cursos pelas redes sociais. Utilizar as cascas de frutas e os talos de vegetais, por exemplo, pode proporcionar uma refeição muito nutritiva. O importante é não deixar o alimento estragar e ir parar na lixeira.

Principais fontes:

Damerum A., et al., Innovative breeding technologies in lettuce for improved post-harvest quality. Postharvest Biology and Technology, 2020.

Henz G. P. e Porpino G., Food losses and waste: how Brazil is facing this global challenge? Horticultura Brasileira, 2017.

FAO. Global food losses and food waste – Extent, causes and prevention, 2011.

 

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