Germoplasma: a diversidade das plantas como você nunca viu
Germoplasma é sinônimo de recurso genético, pois nele é encontrada toda a variabilidade genética de uma determinada espécie. Essa variabilidade resulta em uma importante diversidade gênica a ser empregada no melhoramento de plantas, seja por meio de cruzamentos convencionais ou por ferramentas advindas da biotecnologia.
É fácil visualizar que nós, seres humanos, possuímos uma grande variabilidade genética. Para isso, basta olharmos ao nosso redor e vermos como somos diferentes uns dos outros. O mesmo ocorre com as plantas. O germoplasma é o conjunto de amostras de materiais genéticos que guardam as características genéticas de uma espécie, ou seja, de uma população.
Esse material pode ser parte do tecido vegetal, órgãos das plantas ou até mesmo a própria planta. Se bem conservado, pode durar muitos anos e ser utilizado por cientistas que ainda nem nasceram.
Germoplasma e a produção de alimentos
O germoplasma vegetal é utilizado pela pesquisa para resolver problemas, é a matéria-prima do melhoramento genético de plantas. A partir dele, são encontradas características que podem melhorar os cultivos e ajudar nas intempéries das lavouras, desde fatores abióticos – como a seca – ou bióticos, como aqueles causados por pragas e doenças.
Para isso, o melhoramento genético utiliza o germoplasma de espécies ancestrais e cultivares modernas, para que essas características sejam passadas aos descendentes. É um processo longo e que, dependendo da espécie estudada, pode levar anos para ser concluído. Porém, a biotecnologia atua como acelerador do processo, auxiliando no melhoramento de plantas.
Isso porque, com o emprego de ferramentas biotecnológicas é possível transferir características de interesse para novas cultivares, por meio de técnicas da transformação genética ou edição gênica. Técnicas que são mais rápidas e precisas do que aquelas empregadas no cruzamento de plantas.
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Os benefícios do germoplasma
Os recursos provenientes do germoplasma são muitos e tem trazido benefícios ao desenvolvimento da sociedade há milhares de anos.
Esses benefícios são vistos em novas cultivares cada vez mais produtivas e adaptadas aos diferentes ambientes e adversidades, resultando nas tecnologias disponibilizadas aos agricultores todos os anos.
De fato, quase a totalidade dos alimentos que consumimos hoje, além das fibras e produtos da bioenergia, passaram por um processo de melhoria genética. Com isso, podem ser produzidos em larga escala e estão presentes em nossas vidas de forma bem mais acessível do que no passado.
Apenas para citar um exemplo, a cana-de-açúcar, que produz grande parte do etanol combustível e do álcool utilizado em nossas casas, foi obtida por meio das constantes melhorias ocorridas pelo estudo do germoplasma. Isso permitiu a produção de maiores quantidades de sacarose (açúcar), plantas mais adaptadas a diferentes ambientes, tolerantes a insetos e menos suscetíveis a doenças.
Na produção de fibras, podemos citar os algodões coloridos. Essas plantas, são cultivares de algodão que possuem naturalmente uma coloração diferenciada na sua fibra. Algodões verde, marrom, avermelhado, tudo obtido pelo estudo e pesquisa de germoplasmas.
Nos produtos alimentícios, o milho é um exemplo clássico. O milho ancestral (teosinto) possuía espigas muito pequenas, com grãos que eram duros e não poderiam ser ingeridos.
Com o passar dos anos, primeiro pelos povos ancestrais e depois pelos pesquisadores, milhos com boas
características e com muitos grãos na espiga foram sendo selecionados, até chegar ao milho que consumimos hoje.
Além disso, a biotecnologia vem aprimorando essas plantas, trazendo características que não encontrávamos na espécie. Como por exemplo: a tecnologia Bt (resistência a insetos) que foi introduzida não só no milho, mas também na soja, na cana-de-açúcar e no algodão.
O cacau é outro produto que também vem sendo beneficiado pela combinação de germoplasma e biotecnologia.
O cacaueiro é uma planta que tem sido acometido cada vez mais pelas mudanças climáticas e doenças que reduzem muito a produção. No entanto, com o estudo de genes do próprio germoplasma de cacau – ou a introdução de genes de outras espécies, como alguns da mandioca, – é possível desenvolver plantas resistentes a pragas ou inibir a produção de toxinas em altas temperaturas.
Cacau é melhorado geneticamente pela biotecnologia
Manutenção e segurança do germoplasma
Países que investem na proteção do germoplasma estão mais seguros em relação a sua segurança alimentar. Afinal, o recurso genético é considerado um elemento estratégico para a manutenção da diversidade e com isso, possibilita encontrar maneiras para driblar problemas da fome e da desnutrição.
Por isso, muito tem sido estudado e feito com diferentes germoplasmas. Para que esses estudos possam ser realizados todo esse germoplasma precisa ser conservado e organizado. A ideia é que assim possamos encontrar materiais, quando necessitarmos.
Para isso, existem os bancos de germoplasma, locais que guardam os materiais genéticos das mais diferentes espécies de plantas. Existem bancos de germoplasma no mundo todo, e são nesses cofres que a diversidade genética fica protegida.
Bancos de germoplasma: ferramenta essencial para a conservação da biodiversidade do planeta
Além disso, leis nacionais e internacionais protegem o germoplasma dos países. Por isso, carregar sementes, mudas ou qualquer parte de um vegetal (até mesmo DNA), de um local para outro sem tomar as medidas de segurança necessárias, é crime. Esse intercâmbio de germoplasma precisa ser feito por instituições responsáveis pelos bancos de germoplasma e que possuem registros dos materiais.
Por ser considerado um produto estratégico, o intercâmbio de germoplasma precisa ser feito com autorização de órgãos governamentais, como o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). Tanto entre países, quanto entre estados brasileiros, o MAPA (ou órgãos estaduais) regula o que pode ser intercambiado.
Avanços e inovações do melhoramento genético
Diante dos cenários de mudanças climáticas que ameaçam a agricultura, as informações sobre a genética das plantas se tornam essenciais.
A cultura do trigo, por exemplo, pode ter redução na sua produtividade diante do aquecimento global. Entretanto, a demanda por esse alimento é crescente, o que torna ainda mais importante o desenvolvimento de novas variedades.
Em 2018, o genoma do trigo foi sequenciado e, com isso foi possível identificar genes associados a maior tolerância à seca e calor. Esse avanço pode contribuir para o aumento de produtividade do cereal sem a necessidade de expansão de áreas de cultivo, além de ajudar na resolução de problemas nutricionais.
Por exemplo, o problema de muitas pessoas alérgicas ao glúten (proteína presente no trigo). O mapeamento genético do trigo pode também ajudar a identificar os genes responsáveis por expressar essas proteínas às quais as pessoas são sensíveis, e os pesquisadores podem “desligar” esses genes, produzindo um trigo sem glúten.
Por meio da edição gênica também é possível aprimorar o germoplasma e assim desenvolver alimentos com características nutricionais melhoradas. Um exemplo disso é a criação de um tomate com maiores teores de antioxidantes, usando a técnica de CRISPR.
CRISPR: A surpreendente técnica de edição genética
Germoplasma do tomate
O tomate é uma das culturas mais produzidas no mundo e está presente em muitas preparações alimentícias. A cultura do tomate movimenta mais de R$ 9 bilhões por ano no mercado brasileiro. É a hortaliça que possui maior volume produtivo quando olhamos a produção de frutas e hortaliças.
Existe uma grande variabilidade no germoplasma de tomate, se formos levar em conta os diferentes tamanhos e formatos.
Porém, para características de resistência a pragas e nutricionais, a variabilidade veio se perdendo com o passar dos anos.
Por isso, pesquisadores do Brasil, Estados Unidos e Alemanha, foram buscar essas características em tomates selvagens. Dessa forma é possível identificar genes que possam ser incorporados às características dos tomates comerciais, atuais. Conseguindo assim facilitar a sua produção e até mesmo melhorar o seu sabor.
O resultado é uma cultivar de tomate desenvolvida por CRISPR e que tem o fruto do tamanho do tomate cereja. No entanto, tem um potencial de produção dez vezes maior do que uma planta convencional. Outra característica importante é que essa nova variedade possui cerca de cinco vezes mais licopeno que os tomates convencionais.
Em suma, a abordagem de pesquisa e aprimoramento de germoplasmas de diversas culturas tem um potencial incalculável para a agricultura. De fato, os resultados de pesquisas nessa área revelam a tendência de investigações priorizando a produção sustentável de alimentos, fibras e energia.
Para isso, a conservação e o conhecimento dos materiais genéticos das plantas são essenciais. Afinal, o germoplasma representa um tesouro que poderá nos revelar informações para o futuro, contribuindo para a preservação da biodiversidade e sem perder o olhar no passado.
Principais fontes
Zsögön, A. et al. De novo domestication of wild tomato using genome editing. Nature Biotechnology, 2018.