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Tudo sobre o Látex: da seringueira até a borracha natural

Produzido a partir da seringueira, o látex dá origem a muitos produtos que utilizamos no nosso dia a dia 

Talvez você nunca tenha ouvido falar sobre o látex, mas saiba que vários objetos que utilizamos são produzidos a partir dele. Esse produto nada mais é do que uma seiva leitosa extraída da casca de uma árvore da região amazônica conhecida como seringueira.

Além de ser a principal matéria prima da borracha natural, o látex é essencial para a manufatura de mais de 40 mil produtos. Entre eles, pneus (motos, carros, caminhões e aviões), brinquedos, acessórios, calçados e autopeças. E no setor da saúde o látex é utilizado na fabricação de luvas cirúrgicas, seringas, cateteres e cápsulas.

Diferentemente da borracha sintética (produzida a partir do petróleo), a borracha natural é uma matéria-prima de alta qualidade. Ela é mais elástica, resistente e sustentável, visto que não deixa resíduos no meio ambiente.

Agora que você já sabe a importância do látex, vamos conhecer um pouco mais sobre a planta que dá origem a esse produto.

 

Seringueira: origem e história do látex

A seringueira (Hevea brasiliensis) é uma árvore originária da floresta tropical amazônica brasileira. Ela chega até a 30 metros de altura, com tronco até 60 centímetros de diâmetro. Possui mais de 11 espécies, sendo H. brasiliensis a mais importante devido à qualidade do seu látex e, por isso, a mais procurada pela indústria.

O látex já era extraído até mesmo pelos índios, antes do descobrimento da América. Eles utilizavam esse líquido para fazer “bolas de borracha” para jogos de diversão. No entanto, o primeiro estudo científico sobre esse produto foi no século XVIII. Isso, após o pesquisador francês Charles Marie de la Condamine ter tido contato com a borracha em uma viagem à América do Sul.

Durante essas primeiras pesquisas, cientistas franceses propuseram a utilização da borracha na produção de calçados, garrafas, bolsas e bolas. Anos depois, em 1750, o Brasil colônia começou a utilizar a borracha natural para a produção de botas, para o exército português.

A descoberta do uso da borracha como apagador veio nos anos de 1770. Isso mesmo, a borracha escolar que utilizamos para apagar grafite tem em sua composição a borracha natural extraída da seringueira. 

Posteriormente, com o desenvolvimento de novas técnicas de melhoria de processamento da matéria-prima, ocorreu a expansão do uso do látex. A partir da substância passou-se a produzir correias, mangueiras até chegar em produtos mais modernos, como pneus de avião e materiais cirúrgicos.

 

Os principais centros de cultivo da seringueira e extração de látex

Por muito tempo (1879-1912), o cultivo de seringueira e extração de látex se deu na região amazônica. Isso contribuiu para o desenvolvimento socioeconômico dessa região, que já foi o maior polo de produção e exportação desse produto. 

As cidades de Belém, no Pará, e Manaus, no Amazonas tiveram um grande desenvolvimento urbano por causa dessa atividade. Aumentaram seu comércio interno e melhoraram a renda da população devido ao grande uso e a exportação do látex nesse período. 

No entanto, o plantio da seringueira deixou de ser exclusivo no Brasil quando ingleses contrabandearam sementes da espécie para a Inglaterra. Foi um dos primeiros casos de biopirataria (exploração ou apropriação ilegal de recursos da fauna e da flora) de que se tem notícia no mundo. Lá foram estudadas a fim de se desenvolver variedades mais resistentes, e que fossem produtivas em um clima diferente do encontrado na Amazônia.

A partir daí os ingleses conseguiram produzir seringueiras adaptadas às regiões da Malásia, Ceilão e Cingapura, países que, na época, eram colônias inglesas. Com isso, presenciamos o início de uma produção intensiva da borracha natural na Ásia, que passou a ser grande concorrente da região amazônica.

Atualmente, as plantações de seringueira são realizadas nas regiões dos trópicos e subtópicos, especialmente no sudeste da Ásia e na África ocidental. No Brasil, a maior parte da produção de látex passou a ser realizada no estado de São Paulo, principalmente na região noroeste.

 

Látex sendo extraído da seringueira

 

Cultivo e propagação da seringueira

O nome dado para o cultivo da seringueira é heveicultura, justamente, devido ao nome do gênero botânico em que se classifica a espécie (Hevea spp.). Assim como qualquer outra planta cultivada, a heveicultura precisa seguir boas práticas agronômicas para se ter a proteção contra pragas, doenças e fatores climáticos. Nesse sentido, a melhor forma de se produzir látex é utilizando mudas de seringueira, muito semelhante ao que ocorre nos pomares de laranja.

 

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Uma característica interessante dessa cultura é que, mesmo sendo produzidas por mudas, utilizam-se também as sementes, só que nesse caso como porta-enxertos.

Porta-enxerto: é o nome dado à planta que fica na parte debaixo de algumas espécies de vegetais. Eles são utilizados como base para aproveitar as características de ambas variedades.

Essa metodologia de reprodução é importante porque faz com que a planta consiga ser resistente a algumas pragas, doenças e outros estresses. Além disso, plantas enxertadas conseguem produzir em quase metade do tempo, quando comparada a uma planta obtida por meio de sementes.

 

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As amêndoas (sementes) da seringueira também podem ser usadas na indústria de tintas e vernizes, fornecendo um óleo secativo.

As mudas de seringueira demoram de 4 a 6 meses para estarem prontas para ir ao campo. A partir daí, a árvore de hábito ereto, pode atingir até 30 m de altura, e aos 6-7 anos após o plantio, inicia a produção de látex (borracha).

Em muitos casos, pode-se realizar o cultivo da seringueira juntamente com outras culturas (consórcio), como por exemplo o cacau. No estado da Bahia esse tipo de cultivo tem se mostrado muito lucrativo porque os produtores conseguem se remunerar com as duas culturas.

Uma boa lavoura permite a produção de látex por até 35 anos. E, mesmo ao final do ciclo produtivo ainda é possível aproveitar a seringueira na indústria madeireira e na de matriz energética.

 

Fabricação da borracha natural a partir do látex

Juntamente com o aço e o petróleo, o látex é uma matéria-prima estratégica e sustentável, sendo a base de muitos processos industriais. 

A produção da borracha natural a partir do látex ocorre por um processo de transformação, chamado vulcanização. Nesse processo, a borracha se torna mais elástica, com maior resistência ao calor, aumentando sua possibilidade de usos.

Isso permite que se use a borracha natural na fabricação dos vários produtos que utilizamos no nosso dia a dia. Um pneu de avião, por exemplo, chega a ter 90% de borracha natural.

Seringueira: gráfico informativo explicando a extração do látex

 

A borracha natural tem alta resistência à fadiga, excelente capacidade de aderir a si mesma e a outros materiais. Além disso, possui moderada resistência ao calor, baixa resistência ao rolamento e alta resistência ao corte, lascamento e rasgo.

 

Seringueira e o látex: Gráfico explicativo sobre o ciclo produtivo da borracha

 

Já a borracha sintética, por outro lado, apresenta algumas propriedades superiores quando comparada à natural. Dentre elas, melhor resistência à abrasão, boa elasticidade, melhor resistência ao calor e ao envelhecimento, flexibilidade a baixas temperaturas e resistência à graxa e óleo.

Alguns produtos podem conter apenas borracha natural, apenas sintética ou uma combinação das duas. Um exemplo importante de um produto que requer os dois tipos de borracha são os pneus.

 

Seringueira e o látex: Gráfico comparativo sobre a composição de pneus

 

Produção de látex no Brasil e no mundo

O Brasil produziu em 2022 cerca de 427 mil toneladas de borracha natural, sendo o maior produtor de borracha natural da América Latina.

Só no estado de São Paulo, maior produtor nacional, estima-se que cerca de 30 mil produtores vivem da extração do látex de borracha. Isso, sem contar com a mão de obra contratada para serviços gerais na propriedade. Portanto, há o contexto social, além do fator econômico da cultura. Atualmente, o estado de São Paulo é responsável por 68,2% da produção de borracha brasileira.

Aproximadamente 90 por cento da oferta mundial é cultivada na Ásia. Grande parte disto vem do Sudeste Asiático – especificamente Tailândia, Indonésia, Vietnã e Malásia. Estes quatro países representaram cerca de 70% do valor global das exportações de borracha natural em 2021.

Segundo o portal Statista, a produção de borracha natural em todo o mundo atingiu quase 14,6 milhões de toneladas em 2022. Esse montante é resultado de um crescimento notável desde 2000, quando um total de 6,8 milhões de toneladas métricas de borracha natural foram produzidas globalmente.

A Tailândia produziu 4,75 milhões de toneladas métricas de borracha natural em 2022, representando aproximadamente 35% da produção global de borracha natural naquele ano. Isso fez da Tailândia o principal país produtor de borracha natural do mundo.

Já o país maior consumidor mundial de borracha natural é, de longe, a China. Seu consumo foi de 5,7 milhões de toneladas métricas de borracha natural em 2021, representando mais de 40% do consumo global naquele ano.

 

Desafios e perspectivas para a heveicultura

O maior desafio na produção de seringueiras é o controle das doenças, principalmente uma chamada mal-das-folhas, causada pelo fungo Microcyclus ulei. Esse microrganismo faz com que os galhos, ramos e folhas da planta sequem e caiam. São sintomas que acontecem principalmente em brotos de 10-12 dias de idade. Em brotos mais velhos, formam-se pontos necróticos, com textura áspera e enrugada, parecendo uma lixa.

O controle para essa doença é muito difícil e inviabiliza a produção de mudas. A falta de variabilidade genética das plantas dificulta o melhoramento dessa cultura. Até hoje não foi possível desenvolver uma variedade resistente à doença e que apresente alta produtividade.

A grande expectativa no controle efetivo da doença está nas novas técnicas de edição genética. Em 2020, pesquisadores chineses conseguiram utilizar, pela primeira vez, a técnica CRISPR/Cas9 em seringueiras.

 

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A nova tecnologia permitiu a edição de cinco genes, demonstrando um potencial para modificações genéticas precisas da seringueira como alternativa para expandir sua variabilidade genética. Posteriormente, outros estudos envolvendo técnicas da engenharia genética foram desenvolvidos para melhor compreensão das características da espécie. Quem sabe uma planta totalmente resistente ao mal-das-folhas não pode surgir em breve?

 

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Principais fontes:

Fan Y. et al. Efficient genome editing of rubber tree (Hevea brasiliensis) protoplasts using CRISPR/Cas9 ribonucleoproteins. Industrial Crops & Products, 2020.

Sterling A. et al. Dynamics of photosynthetic responses in 10 rubber tree (Hevea brasiliensis) clones in Colombian Amazon: Implications for breeding strategies. Plos One, 2019.

Statista. Natural rubber production worldwide from 2000 to 2019. Disponível em: https://www.statista.com/statistics/275387/global-natural-rubber-production/. Acesso em 29 set. 2023.

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