Produção de laranjas: Brasil é líder nesse negócio
A produção de laranjas tornou-se uma das mais importantes culturas agrícolas no Brasil. O país detém 50% da produção mundial de suco de laranja e exporta 98% do que produz. O suco de laranja é a bebida à base de frutas mais consumida no mundo, com 35% de participação entre todos os sucos.
Como surgiram os citros e a laranja?
A origem dos cítricos é considerada complexa e sempre foi cercada de controvérsias. A primeira descrição sobre os citros aparece há 2000 a.C. na literatura chinesa, e podem ter se originado no sudeste asiático.
A partir do sequenciamento do genoma de algumas espécies cítricas, incluindo a laranja doce, os pesquisadores conseguiram traçar novas hipóteses de como as espécies de citros foram surgindo.
Depois de muitas buscas e pesquisa nos genomas, os pesquisadores entraram em um consenso e definiram que as espécies primárias (ancestrais) seriam a Citrus medica L. (cidra), C. maxima (Burm.) Osbeck (toranja), C. reticulata Blanco (tangerina) e C. micranta Wester (papeda).
Todas as outras espécies do gênero Citrus foram originadas a partir de cruzamentos entre essas espécies e/ou pela ocorrência de mutações espontâneas. O genoma de todas as espécies de citros híbridos é considerado como um mosaico de diferentes fragmentos de DNA das espécies ancestrais e surgiram a partir de recombinações entre elas.
O que também faz parte desse consenso é que a laranja doce surgiu a partir de um cruzamento entre duas espécies ancestrais, a toranja e a tangerina. Esse cruzamento ocorreu naturalmente, ou seja, sem a interferência humana.
Os pesquisadores sempre suspeitaram que a laranja doce fosse um híbrido natural. Essa suspeita acontecia devido às semelhanças das caracterizações botânicas, bioquímicas e moleculares com outras espécies de citros, como por exemplo a tangerina ‘Ponkan’. Porém, somente com o sequenciamento do genoma é que foi possível confirmar tal informação.
Da China, os citros foram levados para os mais diversos lugares e foram se adaptando nos locais onde foram introduzidos.
Da China para o mundo
Assim como a origem dos citros é bastante conturbada, a difusão da produção de laranja pelo globo também é pouco conhecida. As hipóteses são que da Ásia, a laranja foi levada até o norte da África e de lá teria sido introduzida na Europa pelo sul do continente, em meados da Idade Média (476 d.C. – 1453).
No Brasil, a laranja chegou em meados de 1530, através dos portugueses que enxergaram na laranja uma fonte de vitamina C, nutriente que poderia atuar na luta contra o escorbuto e que estava devastando as tripulações dos navios durante as grandes navegações.
Na década de 1930 o governo português dividiu as terras em capitanias e as entregou para seus homens de confiança administrarem. Foi nesse momento que começaram a surgir as primeiras produções de laranja, o princípio da citricultura brasileira e que se tornaria o maior do mundo.
Os registros são de que as primeiras produções de laranjas e limões foram feitas na então Capitania de São Vicente (litoral de São Paulo), com mudas e tratos culturais trazidos da Espanha.
Atualmente, a produção de laranja está espalhada por muitos países. Seu cultivo é feito por meio de mudas enxertadas, que se desenvolvem e começam a produzir muito mais rápido que uma planta originada diretamente por sementes.
Dependendo da espécie, uma planta enxertada, por exemplo, consegue iniciar sua produção após o terceiro ano de plantio. Enquanto numa planta desenvolvida diretamente por semente, esse tempo pode chegar a 7 anos.
Produção de laranjas e seu consumo
A laranja é a fruta mais produzida no Brasil, seu cultivo está presente em todos os estados brasileiros e no Distrito Federal. Isso faz com que o país seja o maior produtor de laranja doce do mundo. Depois dele, as maiores produções são dos Estados Unidos, China e Índia.
No Brasil, o estado de São Paulo ocupa a primeira posição no ranking de produção, com 77% da produção nacional. Seguido de Minas Gerais (6%), Paraná (5%) Bahia (4%) e Rio Grande do Sul (2%).
Em todo o cinturão citrícola, que compreende o estado de São Paulo e parte do estado de Minas Gerais (Triângulo Mineiro), a safra 2019/2020 teve uma produção de 384,87 milhões de caixas (de 40,8 kg). E quase a totalidade dessa produção é destinada para a indústria de suco.
O país é responsável por produzir três quartos da exportação mundial de suco de laranja. Fato esse que o torna o maior produtor e exportador do mundo.
Movimentando mais de 1 bilhão de dólares por ano, o suco brasileiro chega até os Estado Unidos, China, Japão, União Europeia, Suíça, Coreia do Sul e outros países. A indústria do suco se tornou forte em meados dos anos de 1980, quando se iniciou a exportação de suco de laranja brasileiro.
Desafios na produção de laranjas
Nem sempre a produção de laranjas foi esse sucesso. Entre as décadas de 1930 e 1950, cerca de 20 milhões de árvores de citros morreram em toda América do Sul. A doença que ficou conhecida como Tristeza dos Citros, levava as plantas a um declínio rápido, dizimando os pomares de muitos países.
Na época, muitas hipóteses surgiram para tentar explicar esse declínio rápido da planta afetada. Teorias como problemas fisiológicos, alta umidade e acidez do solo, períodos de seca muito longos e a possibilidade de uma doença causada por microrganismos.
Nessa época, a laranja ‘Azeda’ (Citrus arantium) era utilizada como porta enxerto em todos os pomares. O que não se sabia, é que essa variedade era suscetível a um vírus e esse microrganismo era o responsável pela morte das plantas.
Na década de 1930 e 1940 a Tristeza acabou com as produções da Argentina, Brasil e do Uruguai. Em seguida atingiu também os cultivos da Colômbia e do Peru.
Para tentar desvendar esse mistério, em 1946 os pesquisadores usaram um inseto (pulgão preto dos citros – T. citricidus) para tentar transmitir aqueles sintomas para plantas sadias. Com os resultados positivos, se conseguiu entender que poderia ser um vírus o causador da doença – já que os pulgões têm a habilidade fazer esse tipo de transmissão.
Também nessa época, experimentos usando partes de plantas infectadas enxertadas em plantas sadias comprovaram que a doença poderia ser transmitida por mudas.
Como não havia variabilidade genética nos porta-enxertos, o vírus infectou e causou sérios danos na cultura da laranja. Para conseguir driblar esse grande problema, a pesquisa científica brasileira trabalhou para desenvolver novas tecnologias, tanto de manejo, quanto de variedades melhoradas.
O limão Cravo no combate à Tristeza
Em 1955 o Dr. Sylvio Moreira, descobriu que a enxertia por clones de plantas saudáveis utilizando o porta-enxerto limão Cravo (Citrus limonia), livrou, de vez, a “Tristeza” dos laranjais. Isso porque o limoeiro ‘Cravo’ é resistente ao vírus causador da doença.
Apenas nos anos de 1960 que foi demonstrado que a presença de partículas filamentosas, vistas em microscópio eletrônico, era a responsável pela doença “Tristeza” dos citros. Em 1965 foi possível purificar parcialmente o vírus das plantas, comprovando assim a virose.
Atualmente, o limão cravo é o porta-enxerto mais utilizado no Brasil e com isso, a Tristeza dos citros não é um mais um grande problema nos pomares.
Uma nova ameaça
Atualmente, outra doença se tornou o grande desafio da citricultura. O greening (também chamado de HLB (Huanglongbing) é causado pela bactéria Candidatus Liberibacter spp. e vem sendo um grande desafio para o setor citrícola, pois não são encontrados controles eficazes para a doença.
O greening, embora seja a doença cítrica de relato mais recente no estado de São Paulo, é sem dúvida a que mais tem desafiado a citricultura (produção, extensão e pesquisa) em função de sua rápida disseminação e severidade.
Segundo dados da Coordenadoria de Defesa Agropecuária (CDA) cerca de 50 milhões de plantas já foram eliminadas em função do HLB desde o início dos levantamentos em 2007, ou seja, 26% dos 191,69 milhões de plantas que totalizam o parque citrícola de São Paulo.
Esse tipo de manejo tem ocasionado, além de consequências ambientais, consequências econômicas, levando muitos citricultores a desistirem da atividade ou a abandonarem a erradicação (eliminação) de plantas infectadas.
Nos Estados Unidos, o greening devastou os pomares da Flórida, que é a região de maior produção de laranjas no país. Sem saber mais ao o que recorrer, os produtores de laranja dos EUA já estão usando até antibióticos para tentar controlar a situação.
Aqui no Brasil, o uso de antibióticos nas lavouras não é permitido, por isso o controle da doença tem sido feito, resumidamente com:
- Uso de mudas sadias e livres da doença;
- Erradicação das plantas quando apresentam sintomas da doença;
- Controle do inseto, o psilídeo (Diaphorina citri), vetor da doença;
SAIBA MAIS
Controle biológico se torna aliado no combate a principal doença da laranja
No entanto, ainda não existem desenvolvidas tecnologias capazes de eliminar a bactéria de plantas infectadas.
Ciência e o futuro da produção de laranjas
A biotecnologia, mais precisamente a transgenia e a edição gênica vêm se mostrando as grandes aliadas na produção de laranjas resistentes às mais diversas doenças, entre elas o greening.
O desenvolvimento de plantas cítricas transgênicas com resistência ao greening representa uma estratégia promissora e mais ambientalmente sustentável para combater a doença. Visto que atualmente, o controle dos vetores por inseticidas precisa ser feito rotineiramente.
Além da transgenia, o melhoramento genético empregando CRISPR/Cas pretende desligar genes responsáveis pelos sintomas das plantas, fazendo com que os vegetais não fiquem debilitados e percam sua produção.
Outra estratégia é a de aumentar a atividade de genes responsáveis por reconhecer a bactéria assim que ela entra na planta, fazendo com que a laranjeira consiga se defender mais rapidamente.
Além disso, existem pesquisas onde plantas cítricas geneticamente editadas aumentam a produção de compostos voláteis que repelem a Diaphorina citri, inseto que transmite o greening.
Plantas geneticamente modificadas já estão sendo testadas no campo para os primeiros testes de resposta à doença. Nesse cenário, a tecnologia é de fundamental importância para o desenvolvimento de variedades cítricas resistentes e para que tenhamos uma citricultura cada vez mais sustentável.
Principais fontes:
Caserta R. et al. Citrus biotechnology: What has been done to improve disease resistance in such an important crop?. Biotechnology Research and Innovation, 2020.
Jia H.; Wang N. Generation of homozygous canker-resistant citrus in the T0 generation using CRISPR-SpCas9p. Plant Biotechnology Journal, 2020.