Propriedade Intelectual

A importância da inovação na sociedade

Atualmente é fácil perceber como as tecnologias  estão presentes no nosso cotidiano. O notebook em que trabalhamos, os smartphones que conversamos, ouvimos músicas, tiramos fotos, os smartwatches que monitoram nossos sinais vitais e melhoram nossas vidas significativamente. Para que esses aparelhos funcionem da melhor forma possível, foi necessário um grande investimento para o desenvolvimento de baterias que durem por mais tempo, softwares mais rápidos e designers adequados ao uso diário. Todos esses detalhes são incorporados no valor e na funcionalidade do produto final.

No mundo agrícola não é diferente: a inovação e a tecnologia estão amplamente presentes no campo, proporcionando uma maior e melhor produtividade de alimentos, o que beneficia o produtor, o consumidor, a indústria e a sociedade em geral.

Desafios como o aumento populacional global, mudanças climáticas e preservação o meio ambiente afetam todos os segmentos industriais. O agronegócio, no entanto, é um dos mais impactados, pois precisa suprir a crescente demanda por alimentos atendendo às pressões por produções cada vez mais sustentáveis. 

O Brasil, sendo um dos líderes mundiais na exportação de commodities, enfrenta esses desafios de maneira especial.

O Brasil é referência no agronegócio e essa posição foi conquistada por meio de uma verdadeira revolução “setorial”. Nos últimos 50 anos, especialmente a partir da década de 1970, houve um salto significativo na agricultura. O relato é do professor Antônio Marcio Buainain, docente da Universidade de Campinas e autor do livro Propriedade Intelectual, Royalties e Inovação na Agricultura. Ele destaca que de importador líquido de alimentos e matérias-primas, o país passou a ser produtor e exportador de grãos, proteínas, frutas, fibras e diversos outros produtos.

Fatores como o empreendedorismo do produtor rural, o aprimoramento de políticas agrícolas, o fortalecimento da pesquisa agropecuária (como a EMBRAPA) e a incorporação de inovações ao processo produtivo foram cruciais para esse desenvolvimento. 

Essas inovações permitiram, inclusive, um aumento de 400% na produção entre 1975 e 2020, não apenas com o aumento da área plantada, mas também com a melhoria da eficiência dos instrumentos utilizados no campo. Defensivos químicos, bioinsumos, sementes e biotecnologias são bons exemplos e estão profundamente ligadas à ciência, à pesquisa e ao desenvolvimento (P&D) tanto no setor público quanto no privado.

A P&D é composta por etapas complexas e que exigem consideráveis esforços como tempo, dinheiro e energia – com grandes riscos de insucesso, para o desenvolvimento de produtos cada vez mais inovadores. No mundo agrícola, sabe-se que as empresas de insumos podem levar anos ou até décadas para desenvolver um único produto.

Este novo produto, porém, pode ser uma peça chave para a produção rural, implementando relevantes melhorias no campo e que proporcionam uma melhor qualidade de vida para todos.

A inovação agrícola é um fator indispensável para a produção rural de alto nível, mas vale ressaltar os altos riscos de insucesso no processo de P&D.

O desenvolvimento de um produto inovador requer altos custos com investimento, envolve a contratação de time especializado, equipamentos especializados de pesquisa, custos de instalações específicas, além do longo tempo de duração de testagem.

Diante de todos esses desafios, é inevitável considerar que o inventor precisa de incentivos para continuar assumindo os riscos do custoso processo inovativo. E é aí que a propriedade intelectual entra no assunto.

Segundo a OMPI – Organização Mundial de Propriedade Intelectual, a propriedade intelectual (PI) se refere às criações da mente: tudo desde obras de arte até invenções, passando por programas de computador, marcas e outros sinais comerciais. A Organização ressalta que o reconhecimento de direitos relacionados a essa PI é essencial pois assegura que agentes inovadores terão a oportunidade de obter um retorno justo de investimento, incentivando-os a continuar aplicando tempo, dinheiro, energia e outros esforços em prol da inovação.

É evidente, portanto, que a PI é uma grande aliada da ciência, da pesquisa, da inovação, da sustentabilidade e do futuro, criando um ciclo virtuoso entre a sociedade, o inventor e o produto inovador:

Ciclo Virtuoso do Sistema de Propriedade Intelectual

Figura I – Benefícios do sistema da propriedade intelectual (Jungmann).

A PI tem garantido o desenvolvimento social e econômico em todas as áreas e mantém as portas abertas para a inovação sustentável, implementando a transformação contínua de produtos, processos e serviços que causam impacto ambiental e social.

A PI é um gênero que contém várias espécies, separadas em três grandes grupos: direito autoral, propriedade industrial e proteção sui generis, conforme detalhado na figura abaixo:

 

Figura 2 – Modalidades de direitos da propriedade intelectual (Jungmann).

As espécies de proteção por PI incidem em diferentes aspectos de produtos do intelecto humano. Ou seja, um mesmo item pode ter atributos protegidos por meio de marcas, patentes, segredos industriais, programas de computador e outros, já que estes institutos protegerão partes distintas de determinado produto.

No contexto da agricultura, a propriedade intelectual ocorre majoritariamente nos seguintes contextos:

Todas as espécies de direito relacionadas à propriedade industrial, reguladas no Brasil por meio da Lei nº 9.279, de 1996, a Lei de Propriedade Industrial (LPI) e reconhecidas pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) são de extrema relevância, na medida em que protegem diferentes aspectos de importantes ativos industriais. 

A marca, por exemplo, é um sinal capaz de distinguir os bens e serviços de uma empresa daqueles de outras empresas, o que clama por proteção, por é por meio deste sinal que muitas empresas são reconhecidas no mercado, principalmente por seus clientes e por consumidores.

A patente, por sua vez, é um instituto de inegável importância, já que é um título de propriedade temporária – de 15 a 20 anos, segundo a LPI sobre uma invenção ou modelo de utilidade, outorgado pelo Estado aos agentes inovadores, assegurando a exclusividade da exploração do novo ativo pelo próprio titular, repelindo terceiros de assim o fazer.

No Brasil, a concessão da patente protege, então, invenções e modelos de utilidade que resultem da atividade inventiva e atendam, simultaneamente, três critérios:

(i) novidade – quando desconhecida dos cientistas ou pesquisadores especializados;

(ii) atividade inventiva – a invenção não pode derivar de forma simples dos conhecimentos nele reunidos. É necessário que a invenção resulte de um verdadeiro engenho, de um ato de criação intelectual;

(iii) aplicação industrial – quando demonstrada a possibilidade de utilização ou produção do invento, por qualquer tipo de indústria.

Em contrapartida, os titulares das patentes se obrigam a revelar detalhadamente todo o conteúdo técnico da matéria protegida , o que é benéfico para a sociedade na medida em que esses dados públicos podem ser o ponto de partida para novos estudos, aumentando o conhecimento técnico científico geral.

No contexto agrícola, as patentes são essenciais, na medida em que protegem novos ativos, moléculas, processos e produtos inovadores, que melhoram a qualidade de vida em geral, tanto no campo, quanto para o consumidor final.

Assim como as novas tecnologias presentes em diversos aparelhos eletrônicos que usamos no dia a dia, os defensivos, biotecnologias e outros instrumentos que são utilizados diariamente no campo são patenteados, garantindo benefícios à produção rural não apenas imediatamente, mas também a longo prazo, por conta da inovação.

No mundo agrícola, sabe-se que o melhoramento genético teve um papel fundamental para se alcançar a qualidade alimentícia que temos hoje. Mais sabor ,produção e nutrição, por exemplo, são características que foram desenvolvidas nos alimentos que hoje conhecemos por conta da intervenção humana, prática milenar quando se trata da agricultura.

Diante de todo este contexto, é inegável que a intervenção humana em plantas também merece proteção. Isso porque o processo atualmente envolve longas pesquisas científicas para entregar aos agricultores sementes, mudas, insumos e outros produtos capazes de melhorar rendimento das lavouras, otimizar o uso da terra e garantir sustentabilidade da produção agrícola.

Usando uma nova planta uma nova cultivar é desenvolvida, a proteção assegura que os direitos de utilização e comercialização desse genótipo fique restrito a quem desenvolveu, para garantir o ciclo virtuoso que incentivará a inovação também na criação de novos produtos também nesta área.

Requisitos para o registro de uma nova cultivar:

  • Apresentar uma característica nova;
  • Não deve perder as características essenciais da planta que lhe originou;
  • Ser diferente da cultivar que lhe deu origem por margem mínima de descritores definida pelo órgão competente;
  • Apresentar homogeneidade e estabilidade através de gerações sucessivas.
  • Não deve ter sido comercializada em território nacional em um período de 12 meses ou no exterior em 6 anos para videiras e 4 anos para qualquer outra espécie de planta.

No Brasil, essa proteção é garantida pela Lei de Proteção a Cultivares (LPC) – Lei n. 9.456/1997, que segue 

Patentes

Cultivares

Sendo proteções complementares, as patentes e as cultivares podem incidir sobre um mesmo produto, protegendo diferentes aspectos.

Uma nova variedade de planta desenvolvida a partir de ma tecnologia específica pode conter diferentes tipos de propriedade intelectual, como a proteção de marcas e segredo industrial. O importante é assegurar a segurança jurídica.

No cenário atual, verifica-se que ainda há disposições normativas que enfraquecem a segurança na proteção da propriedade intelectual, causando diversos prejuízos à sociedade, uma vez que podem dar espaço à piratarias, contrafações e má utilização de tecnologias e novos produtos, enfraquecendo, por consequência, o incentivo à inovação

Muito se fala do retorno que a proteção da propriedade intelectual proporciona ao agente inovador e como ele é necessário para manutenção de um sistema de propriedade intelectual saudável. Além do reconhecimento social, técnico e valor moral, o agente inovador precisa de um retorno financeiro para continuar investindo no complexo processo de inovação Esse retorno financeiro é denominado “royalty”, que é pago por terceiro ao titular da PI, pela utilização do ativo protegido.

O licenciamento de uso de produtos que contenham PI é feito entre os terceiros interessados e sujeitos titulares da PI de forma contratual, sendo estabelecidos critérios subjetivos e entre as partes para o pagamento da contrapartida pela exploração do ativo.

Além de eventuais patentes e cultivares, os valores que se estabelecem como retorno à exploração do produto por terceiro fazem menção ao know-how, ao segredo industrial, à marca, ao conjunto de conhecimentos técnicos, científicos, comerciais, administrativos, financeiros ou de outra natureza, de caráter e utilidade práticos, para uso empresarial ou profissional do produto, figurando, portanto, como um contrato que abarca mais do que um único aspecto comercial de um produto, mas um conjunto de elementos, tecnologias, invenções e artifícios que agregam efetivo valor ao produto.

1 Dados CNA – Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária
Notícia EMBRAPA sobre tecnologia e ciência

2 Propriedade intelectual, royalties e inovação na agricultura – (Controvérsias sobre o papel da PI na agricultura) / Antônio Márcio Buainain, Adriana Carvalho de Pinto Vieira e Roney Fraga Souza –
Rio de Janeiro : Ideia D ; INCT-PPED , 2023.

3 JOSÉ GARCIA GASQUES ELIANA TELES BASTOS MIRIAN RUMENOS PIEDADE BACCHI JOSÉ EUSTÁQUIO RIBEIRO VIEIRA FILHO Produtividade Total dos Fatores na Agricultura – Brasil e Países Selecionados.

4 OMPI. Organização Mundial da Propriedade Intelectual. “O que é propriedade intelectual?”.

5 JUNGMANN, D. M. Inovação e propriedade intelectual: guia para o docente. In: Diana de Mello Jungmann, Esther Aquemi Bonetti. – Brasília: SENAI, 2010. Página 18.

6JUNGMANN, D. M. Inovação e propriedade intelectual: guia para o docente. In: Diana de Mello Jungmann, Esther Aquemi Bonetti. – Brasília: SENAI, 2010. Página 20.

7 Propriedade intelectual, royalties e inovação na agricultura – (Controvérsias sobre o papel da PI na agricultura) / Antônio Márcio Buainain, Adriana Carvalho de Pinto Vieira e Roney Fraga Souza –
Rio de Janeiro : Ideia D ; INCT-PPED , 2023. Pag. 54.

8 Informações INPI

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