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Tudo sobre o Látex: da seringueira até a borracha natural

A seringueira é uma árvore de onde é extraído o látex, uma seiva leitosa que é produzida na casca da planta. Talvez você não tenha ouvido falar nesse látex, mas é a partir dele que muitos objetos utilizados no seu dia a dia são produzidos.

O látex é a matéria prima da borracha natural e é essencial para a manufatura de mais de 40 mil produtos usados nas mais diversas possibilidades. Entre eles: pneus (motos, carros, caminhões e aviões), brinquedos, acessórios, calçados, autopeças e no setor da saúde, na fabricação de luvas cirúrgicas, seringas, cateteres e cápsulas.

Diferentemente da borracha sintética (produzida a partir do petróleo), a borracha natural é uma matéria prima de alta qualidade, mais elástica, resistente e sustentável, visto que não deixa resíduos no meio ambiente.

Agora que você já sabe a importância do látex, vamos conhecer um pouco mais sobre a planta que dá origem a esse importante produto.

Seringueira: origem e história do látex

A seringueira (Hevea brasiliensis) é uma árvore tropical originária da região amazônica brasileira. Possui mais de 11 espécies, sendo H. brasiliensis a espécie mais importante devido ao seu látex de melhor qualidade e, por isso, a mais procurada pela indústria. Apesar de ser brasileira, a seringueira se adapta muito bem a regiões que vão da China até São Paulo. 

O látex já era extraído até mesmo pelos índios, antes do descobrimento da América. Utilizavam esse líquido para fazer “bolas de borracha” que eram usadas para jogarem e se divertirem. No entanto, o primeiro estudo científico sobre esse produto natural data de 1735, após o pesquisador francês Charles de la Condamine ter tido contato com a borracha em uma viagem ao Peru.

Durante essas primeiras pesquisas, cientistas franceses propuseram a utilização da borracha na produção de calçados. Anos depois, em 1750, o Brasil colônia começou a utilizar a borracha natural para a produção de botas, para o exército português.

A descoberta do uso da borracha como apagador veio nos anos de 1770. Isso mesmo, a borracha escolar que utilizamos para apagar grafite tem em sua composição a borracha natural extraída da seringueira. 

Porém, a borracha ainda tinha um problema, era muito quebradiça em temperaturas baixas. A mudança começa a acontecer a partir de 1839, quando os estudos do cientista Charles Goodyear levaram ao desenvolvimento do processo de vulcanização, que tem o objetivo de aumentar a resistência e a elasticidade do material.

Essa nova alternativa da utilização da borracha natural abriu caminhos para que em 1888 John Dunlop criasse os pneus. A princípio seriam utilizados para a bicicleta do seu filho, mas o seu uso ganhou as proporções que conhecemos.

Nas décadas seguintes o desenvolvimento de novas técnicas permitiu a expansão do uso do látex. A substância passou a ser utilizada como matéria-prima para a produção de correias, mangueiras até chegar em produtos mais modernos, como pneus de avião e materiais cirúrgicos.

Os principais centros de cultivo

 

Por muito tempo, o cultivo de seringueira e extração de látex se deu na região amazônica (1879-1912), colaborando para o desenvolvimento socioeconômico dessa região, que já foi o maior polo de produção e exportação desse produto. 

A cidade de Belém, no Pará, e Manaus, no Amazonas, tiveram um grande desenvolvimento urbano, aumentaram seu comércio interno e melhoraram a renda da população devido ao grande uso e a exportação do látex nesse período. 

No entanto, os ingleses contrabandearam sementes de seringueira da região amazônica para o Jardim Botânico de Londres. As plantas obtidas por lá foram estudadas a fim de se desenvolver variedades mais resistentes, e que fossem produtivas em um clima diferente do encontrado na Amazônia. 

A partir daí os ingleses conseguiram produzir seringueiras adaptadas às regiões da Malásia, Ceilão e Cingapura, países que, na época, eram colônias inglesas. Com o plantio e o desenvolvimento das plantas nessa região presenciamos o início de uma produção intensiva da borracha natural na Ásia, que passou a ser grande concorrente da região amazônica.

Atualmente, as plantações de seringueira são realizadas nas regiões dos trópicos e subtrópicos, especialmente no sudeste da Ásia e na África ocidental. No Brasil, a maior parte da produção de látex passou a ser realizada no estado de São Paulo, principalmente no noroeste paulista, região de São José do Rio Preto.

Látex sendo extraído da seringueira

Cultivo e propagação da seringueira

Assim como uma lavoura de soja, milho ou plantações de uva e tomate, as seringueiras precisam ser cultivadas seguindo boas práticas agronômicas e protegidas de pragas, doenças e fatores climáticos.

A melhor forma de se produzir látex é utilizando mudas de seringueira, muito semelhante ao que ocorre nos pomares de laranja. 

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Uma característica interessante dessa cultura é que, mesmo sendo produzidas por mudas, as sementes também são utilizadas, só que nesse caso como porta-enxertos.

Porta-enxertos: é o nome dado à planta que fica na parte de baixo de algumas espécies de vegetais.
Os porta-enxertos são utilizados como base para aproveitar as características de ambas variedades.

Essa metodologia de reprodução é importante porque faz com que a planta consiga ser resistente a algumas pragas, doenças e outros estresses. Além disso, plantas enxertadas conseguem produzir em quase metade do tempo, quando comparada a uma planta obtida por meio de sementes.

As amêndoas (sementes) da seringueira também podem ser usadas na indústria de tintas e vernizes, fornecendo um óleo secativo.

As mudas de seringueira demoram de 4 a 6 meses para estarem prontas para ir ao campo. A partir daí, a árvore de hábito ereto, pode atingir até 30 m de altura, e aos 6-7 anos após o plantio, inicia a produção de látex (borracha).

Para um bom desenvolvimento, as plantas de seringueira devem ser cultivadas em locais com temperaturas médias anuais superiores a 20 °C. De fato, a temperatura e a umidade relativa do ar são os principais fatores que influenciam o desenvolvimento e a sanidade dessas plantas.

Em muitos casos, o cultivo da seringueira pode ser realizado juntamente com outras culturas (consórcio), como por exemplo o cacau. No estado da Bahia esse tipo de cultivo tem se mostrado muito lucrativo porque pode aumentar a receita dos produtores, que conseguem se remunerar com as duas culturas.

Uma boa lavoura permite a produção de látex por até 35 anos e mesmo ao final do ciclo produtivo ainda é possível aproveitar a seringueira na indústria madeireira e na de matriz energética. 

Produção mundial do látex e fabricação da borracha natural

Junto com o aço e o petróleo, o látex é uma matéria prima estratégica e sustentável, sendo a base de muitos processos industriais. 

A seringueira tem sua maior produção no sudeste asiático, sendo que 80% da borracha natural do mundo vem de pequenas propriedades da Tailândia, Indonésia e Malásia. De toda a produção, 70% é utilizada na indústria de pneumáticos.

O Brasil produz cerca de 180 mil toneladas de borracha natural, sendo o maior produtor de borracha natural da América Latina. No entanto, o país importa 63% do seu consumo interno e produz 1% do total mundial. 

Segundo a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), o setor produtivo brasileiro da borracha natural e seus derivados gera mais de 100 mil empregos diretos no campo e com isso, renda para inúmeras famílias que vivem da atividade.

O látex é extraído em 16 estados brasileiros: São Paulo, Bahia, Mato Grosso, Minas Gerais, Goiás, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Maranhão, Pará, Paraná, Pernambuco, Acre, Rio de Janeiro, Amazonas, Tocantins e Rondônia. 

São Paulo é o maior estado produtor, sendo responsável por 60% da produção de toda a borracha natural brasileira (cerca de 108 mil toneladas). Goiás produz mais de 20 mil toneladas de látex.

Seringueira: gráfico informativo explicando a extração do látex

Processo de fabricação da borracha natural

 

A produção da borracha natural ocorre por um processo de transformação, chamado vulcanização.

A vulcanização torna a borracha mais elástica, com maior resistência ao calor, aumentando sua possibilidade de usos. Esse processo permite que a borracha natural seja usada na fabricação de pneus, bolas, luvas cirúrgicas e outros produtos importantes no nosso dia a dia. Um pneu de avião, por exemplo, chega a ter 90% de borracha natural.

A borracha natural tem alta resistência e resistência à fadiga, excelente capacidade de aderir a si mesma e a outros materiais, moderada resistência ao calor, baixa resistência ao rolamento e alta resistência ao corte, lascamento e rasgo. 

Por outro lado, algumas propriedades superiores da borracha sintética incluem melhor resistência à abrasão, boa elasticidade, melhor resistência ao calor e ao envelhecimento, flexibilidade a baixas temperaturas e resistência à graxa e óleo. 

Algumas especificações do produto podem exigir apenas borracha natural, apenas sintética ou uma combinação das duas. Um exemplo importante de um produto que requer os dois tipos de borracha são os pneus.

Seringueira e o látex: Gráfico comparativo sobre a composição de pneus

Segundo o portal Statista, a produção de borracha natural em todo o mundo atingiu mais de 13,6 milhões de toneladas em 2019. Esse montante é resultado de um crescimento notável desde 2000, quando um total de 6,8 milhões de toneladas métricas de borracha natural foram produzidas globalmente.

Seringueira e o látex: Gráfico explicativo sobre o ciclo produtivo da borracha

Em 2018, 12,64 milhões de toneladas (91%) da borracha natural do mundo foram produzidas na Ásia-Pacífico. Em segundo lugar, 6,5% da borracha natural do mundo foi produzida na Europa, Oriente Médio e África.

O portal Statista também traz dados que entre 2018 a 2019, o consumo de borracha natural na forma final de pneus e câmaras de ar foi estimado em 864 mil toneladas no mundo. Durante esse período, o consumo de produtos de borracha natural chegou a 348 mil toneladas métricas em todo o mundo.

Desafios e perspectivas para a heveicultura

Heveicultura é o nome dado para a cultura da seringueira, devido ao nome do gênero botânico em que a espécie é classificada (Hevea spp.).

O maior desafio na produção de seringueiras é o controle das doenças, principalmente a chamada mal-das-folhas, provocada por um fungo (Microcyclus ulei). Esse microrganismo faz com que os galhos, ramos e folhas da planta sequem e caiam. Esses sintomas acontecem principalmente em brotos de 10-12 dias de idade. Em brotos mais velhos, são formados pontos necróticos, com textura áspera e enrugada, parecendo uma lixa.

O controle para essa doença é muito difícil e inviabiliza a produção de mudas. A falta de variabilidade genética das plantas dificulta o melhoramento dessa cultura. Até hoje não foi possível desenvolver uma variedade resistente à doença e que apresente alta produtividade.

A grande expectativa no controle efetivo da doença está nas novas técnicas de edição genética. Em 2020, pesquisadores chineses conseguiram utilizar, pela primeira vez, a técnica CRISPR/Cas9 em seringueiras.

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CRISPR: A surpreendente técnica de edição genética

CRISPR Cas9 marca evolução do melhoramento genético

A nova tecnologia permitiu a edição de cinco genes, demonstrando um potencial para modificações genéticas precisas da seringueira como alternativa para expandir a variabilidade genética dessa espécie. Quem sabe uma planta totalmente resistente ao mal-das-folhas não pode surgir em breve?

 

Principais fontes:

Fan Y. et al. Efficient genome editing of rubber tree (Hevea brasiliensis) protoplasts using CRISPR/Cas9 ribonucleoproteins. Industrial Crops & Products, 2020.

Sterling A. et al. Dynamics of photosynthetic responses in 10 rubber tree (Hevea brasiliensis) clones in Colombian Amazon: Implications for breeding strategies. Plos One, 2019.

Statista. Natural rubber production worldwide from 2000 to 2019. Disponível em: https://www.statista.com/statistics/275387/global-natural-rubber-production/. Acesso em 20 ago. 2020.

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