Oportunidades para o agronegócio brasileiro muito além da China
A exportação agrícola brasileira registrou uma alta de 20% em 2021 em comparação ao ano anterior (2020). E um dos maiores compradores de commodities é a Ásia. A Ásia, com a inclusão do Oriente Médio, é responsável por dois terços das exportações brasileiras. Em 2000, a China representava 1% e, hoje, representa quase 40%.
De acordo com o professor sênior de agronegócio global do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper) e coordenador do centro Insper Agro Global, Marcos Jank, essa região é muito importante para o agronegócio do Brasil. Um dos países que mais contribui para isso é a China, mas outros locais são de extrema relevância, como o Japão, “um comprador tradicional do Brasil desde os anos 70”.
Com o objetivo de levar conhecimento sobre o agronegócio brasileiro para vários lugares do mundo, a CropLife Brasil lançou a publicação “Atlas do Agronegócio Brasileiro: uma Jornada Sustentável” também em japonês. As versões em português e em inglês já estão disponíveis. A curadoria traça e contextualiza a história da agropecuária do país com enfoque na sustentabilidade.
Para entender mais sobre o mercado asiático, conversamos com o professor Marcos Jank. Confira a entrevista.
Como é a relação do agronegócio do Brasil com o mercado asiático?
A Ásia é um mosaico de realidade, e cada região tem uma característica. O agronegócio, apesar de ter crescido muito para a Ásia, ainda sofre barreiras importantes, principalmente os produtos de maior valor adicionado. Por exemplo, é muito fácil exportar soja, porém é muito mais difícil exportar carnes, porque são bastante protegidas, e os países tendem a fazer restrições, como é o caso do Japão. Mas existe uma agenda Brasil-Japão a ser trabalhada. Podemos citar em relação ao etanol. Eles têm um programa específico que é feito com o etanol de cana brasileiro, porque é melhor que o etanol de milho.
Por outro lado, apesar de a China, hoje, ser de longe nosso maior comprador, existe uma visão incompleta de que a nossa relação é apenas com os chineses. O país é o holofote do presente, porém, com o passar do tempo, as outras economias emergentes, particularmente as do sudeste da Ásia (Indonésia, Vietnã, Cingapura, Malásia), vão crescer, e também tem o sul da Ásia, com a necessidade futura de alimentos na Índia. O sudeste da Ásia já compra mais do que a União Europeia. Vejo essa região com muito potencial.
Na sua opinião, qual seria a maior dificuldade para o Brasil conquistar mais essa região?
O maior problema do Brasil é o acesso, que ainda dificulta a venda de alguns produtos em certos mercados devido às barreiras altas, barreiras não tarifárias.
Um outro desafio importante é o da diversificação. Basicamente, o Brasil exporta 10 grandes grupos de commodities. É preciso diversificar mais a pauta em termos de produtos e destinos, melhorar o acesso aos mercados no sentido de abrir e reduzir barreiras ao comércio. Isso deveria ser feito não só bilateralmente, mas através de negociações comerciais. Esse é um desafio, porque o Brasil cresceu na exportação sem ter feito acordos comerciais com ninguém. Diferentemente da Austrália e da Nova Zelândia, que são nossos concorrentes, e dos Estados Unidos e Canadá, que têm acordos comerciais com a Ásia há muito tempo, o Brasil precisaria fazer acordos com países ou com blocos de países.
O Brasil tem recebido críticas em relação às formas de conduzir temas como meio ambiente e políticas públicas. Essa situação pode afetar a imagem do agronegócio desenvolvido no país?
Em relação à imagem, ela varia muito dependendo do assunto. Quando falamos de competitividade, o Brasil é visto, de maneira geral, como um país muito competitivo. É um grande fornecedor e sempre oferece grandes volumes a preços muito competitivos de tudo. Nesse sentido nossa imagem é boa.
Quando vem a questão ambiental, a imagem é muito ruim. E se tornou muito ruim nos últimos anos. A razão principal da deterioração da imagem é o fato de a gente ter um telhado de vidro: o desmatamento. O que mais atrapalha é estarmos associado ao desmatamento, e nisso há um monte de problema que tem que ser consertado, inclusive, que o desmatamento existe, mas que ele não é causado pelo grosso do agronegócio. O grosso do agronegócio não está produzindo na Amazônia e não está expandindo ilegalmente, está expandindo dentro da lei.
Agora, nos últimos anos, há desmatamento ilegal em taxas muito altas e crescentes. O índice tinha caído muito de 2004 a 2014 e depois voltou a crescer. Caiu de 3 milhões de hectares por ano para 500 mil hectares por ano e agora subiu para 1,3 milhão de hectares. Isso afeta a nossa imagem, essa associação feita, principalmente, por meio de redes sociais, da grande mídia, de uma presença muito grande de jornalistas de ONGs, de bancos, todo mundo está olhando a questão da Amazônia. Hoje, eu diria que a Amazônia é um tema que representa muito mais o Brasil do que futebol e samba.
Mesmo assim, esse problema de imagem, apesar de ter afetado nossa reputação e a capitalização de algumas empresas, não está impedindo o comércio com a Ásia por uma razão muito simples: a Ásia precisa de commodities, particularmente depois da pandemia. De 2020 para 2021, a exportação aumentou 20% – de 100 para 120 milhões de dólares, um aumento gigantesco. E quem puxa isso é a Ásia.
Mesmo com esse lado positivo, como o Brasil pode melhorar a imagem no exterior?
Precisa olhar a questão da imagem em duas óticas. Uma é a lição de casa que não está sendo feita, principalmente no combate à ilegalidade, e a outra é o trabalho que tem que ser feito em vários locais asiáticos com a presença do setor privado. Hoje, há poucas entidades do agro presentes por lá. Tem que ter uma narrativa no sentido de explicar a realidade brasileira, como, por exemplo, mostrar por que o desmatamento continua, o que está sendo feito para combatê-lo e que essa ação não tem ligação com o agro moderno.
A lição é cumprir a lei brasileira: é implementar o código florestal, é fazer a regularização fundiária, é criminalizar o desmatador ilegal. Não gosto dessa coisa de achar que você tem um monte de inimigos pelo mundo. O Brasil tem culpa no cartório nessa área e precisa fazer a lição de casa. Para eles, o Brasil é um país muito distante, uma cultura muito diferente da deles.