Melhor uso da água: startups inovam em tecnologias para o campo
Gerir de forma racional e sustentável água: a inovação no campo para entregar o melhor uso da água nas lavouras.
O desenvolvimento de novas tecnologias para o uso da água na agricultura é uma busca constante. Dentro da produção agrícola, o investimento em infraestruturas hídricas que atendam à necessidade do campo sem desperdício do recurso tem se mostrado crescente há muitos anos.
Uma prova disso está no relatório Radar Agtech Brasil 2020/2021, um mapeamento das startups do setor agro no país. O documento aponta 1574 startups distribuídas em todo o território nacional. Se observa um aumento no número de empresas que desenvolvem e disponibilizam equipamentos, métodos e processos para melhoria da previsão de chuvas e trazem uma melhor gestão e eficiência no processo de irrigação,
Houve um crescimento de 62% de empresas ligadas ao tema (21 em 2019 e 34 em 2020/2021), o que revela a atenção do setor com uso racional desse recurso essencial para qualquer cultivo.
Doutorado ligado à água virou negócio
Um exemplo de desenvolvimento de tecnologia ligada ao uso da água vem do engenheiro-agrônomo Leandro Fellet, CEO da startup Agromakers, localizada em Piracicaba, interior de São Paulo.
Desde a conclusão do curso de agronomia, ele trabalha com irrigação e transformou sua tese de doutorado em uma startup.
“Desenvolvemos um algoritimo que traduz a necessidade de água das plantas através de um sensor de umidade do solo que possui precisão 100 vezes maior do que os sensores tradicionais”
Leandro Fellet, Ceo da Agromarkers
Através da IoT (Internet das Coisas), o algoritmo é conectado ao sistema de irrigação. “Conseguimos interpretar qual é a real necessidade de água das plantas. Não esperamos a planta ficar tão seca.
Ela chega num ponto de umidade que, agronomicamente, é identificado como ideal e já aciona o sistema de irrigação para que sofra menos e tenha condições agronômicas favoráveis para se desenvolver ao máximo possível. É como se o sistema radicular acionasse um botão.”
Com a metodologia aprovada, Fellet montou a startup. Em 2020, a empresa foi instalada na EsaqTec -incubadora tecnológica que atua junto à ESALQ/USP (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiróz/Universidade de São Paulo) e, após isso, teve investimento de uma fintech. O aporte financeiro permitiu a evolução dos equipamentos.
Além da água, a startup também criou um acessório para ser utilizado no equipamento para aplicação de fertilizantes (fertirrigação). Com o processo é possível dosar a quantidade de nutrientes conforme a marcha de absorção ideal para o desenvolvimento da planta.
Sistema Agromakers para o controle da irrigação e fertirrigação
Com isso, há economia de água e de adubos. O equipamento auxilia no uso de fertilizantes aliado a irrigação potencializando a produção em 40% a 50% em algumas culturas, como as de grande valor agregado.
“Com o uso de tecnologia correta, conseguimos uma redução de cerca de 30% na quantidade total de água aplicada nas plantas e um aumento de produção de até 40% com a cultura do mirtilo, por exemplo. Como esse produto é de alto valor agregado, o retorno financeiro é muito interessante para o produtor”. A tecnologia pode ser aplicada em outras culturas como tomate, pimentão e pepino.
Ainda novata no mercado, para facilitar a distribuição dos equipamentos, a startup tem a Cooperativa dos Plantadores de Cana do Estado de São Paulo (Coplacana) como parceira, responsável por comercializar a venda ou locação dos produtos com agricultores. A cooperativa utiliza o sistema em duas propriedades, fazendas experimentais para condução da lavoura, como explica o superintendente de Inovações Klever José Coral.
“A economia de água não é direta porque depende de fatores como tipo de cultura, evaporação. Mas podemos dizer que gira em torno de 20% a 30%, o que leva também a uma economia de energia”
Klever José Coral, Superintendente de Inovações da Coplacana
Será que vai chover?
Uma outra startup que também oferece serviços em gestão da água é a Zeus Agrotech. Criada em 2016, está localizada em Uberlândia, região do Triângulo Mineiro, em Minas Gerais. A empresa, 100% brasileira, nasceu a partir de uma pesquisa com agricultores.
“Vimos que uma das grandes dores do agricultor é saber realmente se vai ou não chover. A empresa foi pensada com o objetivo de auxiliar o produtor a entender qual é o comportamento climático hídrico da propriedade”
Márcio Boralli, Diretor Comercial da Zeus Agrotech
“Sabemos que a chuva não é homogênea e a nossa ideia foi construir uma solução chamada rede de pluviometria para mostrar ao agricultor o que realmente acontece em cada talhão”, complementa o diretor comercial e engenheiro-agrônomo da Zeus Agrotech, Márcio Boralli.
A rede de pluviometria consiste em estações meteorológicas e pluviômetros digitais distribuídos ao longo da propriedade, chamada Plataforma Inteligente de Coleta (PIC). Com a rede, consegue-se medir temperatura, umidade, velocidade e direção do vento, quantidade e qualidade da chuva de cada cultura em determinado lugar. O agricultor tem esses dados num portal de web ou num aplicativo e, também podem ser integrados e disponíveis em máquinas agrícolas, como tratores.
Com o monitoramento, o produtor vai saber o quanto choveu, como está a umidade do solo e esses dados auxiliam na tomada de decisão para escolher o melhor momento e como devem ser realizados os plantios, por exemplo.
“A tecnologia ajuda a conhecer o comportamento climático e entender cada vez melhor o que acontece em cada ponto da fazenda para que o agricultor possa produzir cada vez mais com otimização e uso racional da água. Ao invés de aumentar a área, ele pode explorar o potencial produtivo em cada hectare”, destacou o engenheiro-agrônomo.
A solução oferecida ao agricultor não precisa, obrigatoriamente, de conectividade. Caso o local não tenha sinal de internet (3G, 4G), a conectividade ocorre via satélite. A startup tem mais de 3 mil equipamentos espalhados em 16 estados atendendo as culturas de grãos, citrus, cana-de-açúcar, café e reflorestamento.
Muitos desses equipamentos estão distribuídos nas propriedades da Algar Farming, empresa de agronegócios do grupo Algar. Presente em Minas Gerais e Mato Grosso do Sul, a indústria foi fundada em 2014 e conta com 23 mil hectares de área de plantio para cultivo de soja, milho, sorgo, batata, algodão, feijão e cana-de-açúcar.
Dois anos depois, tornou-se um dos primeiros clientes da startup Zeus Agrotech e passou a ter cobertura de todas as áreas com estações meteorológicas que coletam dados de temperatura, pluviometria, velocidade do vento e umidade do ar.
“O acompanhamento do volume de chuva era feito através de pluviômetros instalados em pontos específicos das fazendas e a coleta de dados era realizada de forma manual diariamente.
Com a instalação e ampliação dos serviços, ganhamos mais agilidade na coleta e compilação dos dados”André Luís Ribeiro, Diretor de Operações da Algar
Segundo o diretor de operações da Algar, André Luis dos Santos Ribeiro: “Com toda essa implantação de tecnologias conseguimos através dos dados obtidos nos planejar, gerenciar e tomar decisões mais assertivas no campo, impactando diretamente no aumento de produção, tomadas de decisões mais eficientes, menores impactos ambientais, um excelente gerenciamento de risco e assim alavancando a produtividade no campo e a lucratividade dos negócios”.