Fixação biológica de nitrogênio no campo ganha destaque internacional
A microbiologista Mariangela Hungria, da Embrapa Soja (PR), integra a lista dos 100 mil cientistas mais influentes do mundo. É um reconhecimento pelo trabalho desenvolvido por ela em Fixação Biológica de Nitrogênio (FBN).
A lista foi organizada pela Universidade de Stanford (EUA), a partir de um banco de dados mundial com sete milhões de pesquisadores. Para definir os nomeados, foram utilizadas citações da base de dados Scopus, com a atualização da posição dos profissionais em dois rankings: impacto ao longo da carreira e no ano de 2019.
A agrônoma Mariangela Hungria, que integra a equipe da Embrapa desde 1991, tem mais de 700 publicações e acumula títulos e premiações.
A CropLife Brasil conversou com a pesquisadora, uma apaixonada por microrganismos e pela agricultura.
Microrganismos são fontes de tecnologia
O que representa ser reconhecida como uma das cientistas mais influentes do mundo?
Ter esse reconhecimento foi uma grande surpresa. Em comparação com os pares do Brasil, sei que sou bem classificada, mas internacionalmente, a comparação não é fácil. Esse ranking dos mais influentes do mundo é feito com base em publicações, em citações dessas publicações, ou seja, quem leu seus trabalhos, analisou e achou que eles são relevantes e passou a citá-los.
Como vou comparar isso com um laboratório no exterior que tem projetos com valores 10, 20, 30 vezes maiores do que os nossos? Então, esse reconhecimento é muito importante. Nós, aqui no Brasil, somos muito criativos e vamos atrás das coisas de uma forma ímpar no mundo.
Em que consiste a pesquisa da tecnologia de fixação biológica de nitrogênio?
Desde que eu me entendo por gente, amo os microrganismos e a agricultura, então não foi muita surpresa para mim e para as pessoas do meu convívio que eu decidisse pela microbiologia agrícola.
O trabalho consiste em identificar e selecionar as melhores estirpes de bactérias que capturam nitrogênio do ar e o transforma em fertilizante sem custo para a planta. Além das bactérias do gênero Bradyrhizobium (rizóbios), desenvolvemos outras linhas de pesquisa com os microrganismos Azospirillum (bactéria promotora de crescimento de plantas- BPCP) para as culturas do milho e trigo e a coinoculação de rizóbios e Azospirillum para o cultivo da soja e do feijoeiro.
Que resultados a fixação biológica de nitrogênio traz para a agricultura?
Agora, estamos vendo uma verdadeira explosão do conhecimento dos benefícios dos microrganismos na agricultura. Com a fixação biológica de nitrogênio, no caso da soja, a última estimativa é que, por ano, tenha-se uma economia de U$$14 bilhões. Valor que deixa de ser gasto com fertilizantes químicos nitrogenados. No Brasil, 25% da área cultivada do grão já praticam a coinoculação e, os ganhos dobram quando se usa as duas bactérias (Bradyrhizobium e Azospurillum). A Azospurillum aumenta muito a raiz e, aumentando a raiz, a outra bactéria faz mais nódulos e consegue fixar mais nitrogênio. Uma planta com mais raiz, absorve mais água e aproveita mais os nutrientes. Temos visto que essas plantas conseguem tolerar melhor um período moderado de seca.
Quais são os planos da senhora para o futuro?
Nós temos o conhecimento científico. Deveríamos ser chamados para ajudar a definir políticas públicas de sustentabilidade agrícola. Como engenheira agrônoma, fico arrasada em ver pastagens degradadas. Estima-se que 70% das pastagens estão com algum grau de degradação, sendo 50% com um grau muito sério. No ano que vem, teremos um grande lançamento para recuperação desses locais. Apesar de já estar com mais idade, poderia pensar no final da carreira. Estou super animada com uma série de oportunidades que estão surgindo. Espero revolucionar esse panorama de sustentabilidade no Brasil e trabalhar firme para que os microrganismos ajudem a reverter esse cenário. Eu queria muito contribuir com isso, antes de encerrar minha carreira.