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Arroz dourado está perto de chegar ao consumidor após 20 anos

Mais um passo foi dado para que o arroz dourado possa ser produzido e comercializado em países com alto índice de população com deficiência em vitamina A.  Bangladesh, Vietnã, Índia, Indonésia e Filipinas são exemplos de regiões onde o arroz é um alimento essencial.

Grande parte da população desses países vive em extrema pobreza e, portanto, se beneficiariam fortemente com o uso dessa tecnologia.

Em uma vitória da tomada de decisões regulatórias baseadas em ciência, o governo das Filipinas autorizou, em 10 de dezembro de 2019, o consumo da cultivar transgênica e, com isso, se tornou o primeiro país Asiático a aprovar a tecnologia.

As aprovações para consumo favorecem que o produto seja liberado para plantio, uma vez que os mercados já se preparam para receber a nova cultivar transgênica. 

Caso você nunca tenha ouvido falar, o golden rice (como é conhecido mundialmente) é uma variedade geneticamente modificada (GM) de arroz, que passa a produzir altos níveis de betacaroteno, precursor da vitamina A.

Arroz dourado no Bangladesh

Antes que o arroz dourado possa ser comercializado nos países em que foi aprovado para consumo, deverá, primeiramente, passar pela produção de sementes em larga escala e receber um registro. 

Por isso, existe uma grande expectativa sobre o resultado do processo que está em avaliação no Ministério do Meio Ambiente, Florestas e Mudanças Climáticas de Bangladesh, desde novembro de 2017, e que deve sair ainda esse ano.

Tudo indica que Bangladesh será o primeiro país em que, de fato, os agricultores poderão plantar arroz dourado e vendê-lo para consumo humano. Esse cenário é esperado, pois os testes de campo conduzidos nas Filipinas e em Bangladesh não mostraram motivos para preocupação. Tal análise é o mais importante resultado da regulamentação desse produto, pois Bangladesh é o quarto maior produtor de arroz do mundo.

Enquanto isso, grande parte do mercado internacional já está pronto para receber o arroz dourado. O produto já foi aprovado para consumo em países desenvolvidos como Estados Unidos, Canadá, Austrália e Nova Zelândia. Mesmo que não sejam países a quem se destina o produto, os pareceres positivos servem de embasamento para que outras regiões o aprovem. Além disso, essas aprovações garantem o trânsito do arroz dourado evitando qualquer barreira regulatória caso o alimento entre nesses países.

Após aprovado, ainda serão realizados testes de campo para certificar a qualidade das sementes a serem comercializadas. De fato, se tudo correr bem, os agricultores de Bangladesh poderão ter sementes de arroz dourado para plantar em 2021. 

A Importância do arroz dourado

No organismo humano, a vitamina A é primordial para o crescimento e desenvolvimento dos tecidos. Ela mantém a pele saudável e, com isso, possibilita a manutenção da primeira defesa do organismo contra infecções. 

É importante dizer que o nutriente está presente em alimentos como espinafre, batata-doce, cenoura, brócolis e outros vegetais. Apesar disso, em alguns países, particularmente naqueles onde o arroz é um alimento principal da dieta, a deficiência de vitamina A ainda é um problema de saúde.

Meio milhão de crianças ficam cegas a cada ano por causa da deficiência de vitamina A, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Além disso, a OMS estima que mais de 100 mil crianças menores de cinco anos morrem todos os anos por falta desse nutriente. 

A carência de vitamina A compromete o sistema imunológico e causa mortalidade por doenças, como diarreia e infecções respiratórias leves.

Em Bangladesh estima-se que uma em cada cinco crianças em idade pré-escolar apresenta deficiência de vitamina A. Nas Filipinas, três a cada dez crianças em idade escolar e uma a cada cinco mulheres grávidas têm deficiência de vitamina A.

Para se ter uma ideia da importância do arroz nesses países, tomemos o Brasil como referência. Aqui, o arroz faz parte das refeições mais importantes, a ponto que o brasileiro consome em média 34 kg de arroz em um ano. Países como Bangladesh e Filipinas apresentam um consumo de arroz, por pessoa, que chega a 170 kg e 115 kg respectivamente. 

Disponibilizar o nutriente a partir de um alimento que já faz parte da dieta de uma população é uma estratégia inteligente e que realmente pode solucionar o problema que afeta milhões de pessoas no mundo. Esse é o real objetivo do Provitamin A Biofortified Rice Event GR2E (nome técnico do arroz dourado) que foi criado com fins humanitários para combater a deficiência de vitamina A em regiões de extrema pobreza, especialmente na Ásia. 

A tecnologia do arroz dourado

O arroz convencional produz β-caroteno (provitamina A) nas folhas, mas não no grão. Para fazer com que o arroz produzisse esse composto no grão, os pesquisadores utilizaram a tecnologia de transformação genética para ativar essa via metabólica em todas as partes da planta.

Essa estratégia de melhoramento genético foi selecionada após não serem identificados cultivares de arroz capazes de acumular provitamina A no endosperma, impossibilitando que o melhoramento convencional pudesse ser utilizado para a introdução da característica desejada. 

Foram então selecionados dois genes pertencentes a via biossintética dos carotenóides para serem adicionados no genoma do arroz: o psy1 (fitoeno sintase) de milho e o crt1 (caroteno desnaturase) da bactéria Pantoea ananatis.

A função desses genes é produzir fitoeno (molécula que dá início a produção de carotenóides em plantas) e transformá-lo em licopeno nos grãos de arroz. No entanto, o licopeno não é o produto final dessa via metabólica.

Ele serve para que outros genes, já ativos no grão de arroz, o convertam em β-caroteno. Por isso, o arroz transgênico é amarelo e não vermelho, como é o caso de alimentos que acumulam licopeno.

Todas estas etapas pode-se observar mais na imagem abaixo:

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Arroz rico em betacaroteno é exclusividade da transgenia 

As avaliações de dois anos de cultivo do arroz dourado mostraram que a nova variedade transgênica (GR2E) acumula 11.4 µg/g de provitamina A no grão. Outras variedades de arroz possuem zero. 

Estudos mostram que a bioconversão do β-caroteno pelo organismo é muito eficiente e que aproximadamente 150g do golden rice é suficiente para suprir as necessidades de vitamina A em crianças de 6 a 8 anos. 

Com exceção da produção de provitamina A no grão, o arroz dourado é idêntico ao arroz convencional.

O atraso do arroz dourado

O arroz dourado foi desenvolvido no final dos anos 90 pelos cientistas alemães de plantas Ingo Potrykus, professor do Swiss Federal Institute of Technology e Peter Beyer professor do departamento de biologia celular da universidade de Freiburg. O objetivo era combater a deficiência de vitamina A. Na imagem abaixo pode-se acompanhar a evolução do arroz dourado ao longo dos anos.

Arroz dourado ao longo dos anos

 

Em 2000, a notícia de que um arroz geneticamente modificado e mais nutritivo tinha sido desenvolvido chegou a toda a população. Os pesquisadores responsáveis pelo arroz dourado chegaram a estampar a capa da revista Times, que dizia: arroz pode salvar milhões de crianças todos os anos.

No entanto, duas décadas depois ainda não temos o arroz dourado disponível para consumo. Por quê?

O arroz dourado é uma planta transgênica e precisa passar por um processo de regulamentação extremamente rigoroso. O tempo para que um produto seja aprovado e registrado pode chegar a 15 anos. 

Além disso, desde que foi noticiado, o arroz dourado tem enfrentado fortes ataques de movimentos que vão contra a liberação de Organismos Geneticamente Modificados (OGM). 

Plantas transgênicas: uma introdução sobre essa importante tecnologia

Saiba mais

Em 2013, campos experimentais de arroz dourado nas Filipinas chegaram a ser destruídos por ativistas. A pressão desse grupo para que o governo não aprove culturas transgênicas ainda é muito grande. Portanto, se estabeleceu uma longa batalha de pesquisadores contra críticos que insistem em negar os dados científicos e preferem privar as pessoas de um benefício.

Inclusive, o arroz dourado já foi apoiado em manifesto por 155 vencedores do Prêmio Nobel, que pediram para que pessoas contrárias à tecnologia apoiassem a ciência. 

São mais de 20 anos de adoção de culturas transgênicas no campo. Os produtos já foram rigorosamente testados e jamais comprovaram prejuízos à saúde humana, animal ou ao meio ambiente.

Portanto, o arroz dourado permanece na prateleira simplesmente devido a obstáculos políticos e disputas ideológicas. E vale lembrar que o Golden Rice é um projeto sem fins lucrativos. A tecnologia foi doada pelos seus inventores no ano de 2000, justamente para ajudar países carentes e que sofrem com a deficiência de vitamina A.

Principais fontes: 

Golden Rice Project: Disponível em: http://www.goldenrice.org/index.php. Acesso em: 03/04/2020.

Stokstad, E. Bangladesh could be the first to cultivate Golden Rice, genetically altered to fight blindness. Science magazine, 2019.

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